O marco temporal das terras indígenas, também conhecido como tese de Copacabana, é uma tese jurídica, construída jurisprudencialmente no julgamento do caso Raposa Serra do Sol pelo Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil de 2009. Nela, o Supremo decidiu que o artigo da Constituição que garante o usufruto das terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas brasileiros deveria ser interpretado contando-se apenas as terras em posse em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição
A tese foi apresentada pelo ministro Menezes Direito, junto com dezenove outras condicionantes que objetivavam dar maior segurança jurídica ao processo de demarcação de terras indígenas. O nome "tese de Copacabana" vem de um comentário do ministro Gilmar Mendes em julgamento de 2014 que reafirmou o marco temporal: "Claro, Copacabana certamente teve índios, em algum momento; a Avenida Atlântica certamente foi povoada de índios. Adotar a tese que está aqui posta nesse parecer, podemos resgatar esses apartamentos de Copacabana, sem dúvida nenhuma, porque certamente, em algum momento, vai ter-se a posse indígena".
Posteriormente, em embargos de declaração, o STF acabou esclarecendo que as condicionantes aplicavam-se somente àquele caso específico.[5] No entanto, durante o governo Michel Temer, a partir de parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), entendeu-se o precedente de Raposa Serra do Sol como obrigatório para todos os processos de demarcação de terras indígenas
Desde 2019, a questão voltou à tona com o julgamento do Recurso Extraordinário 1.017.365, caso em que está em disputa o reconhecimento de uma área reclamada por indígenas do povo Xoclengues, na Reserva Biológica do Sassafrás, em Santa Catarina. O STF reconheceu "repercussão geral" ao caso, o que significa que aquilo que vier a ser decidido determinará precedente para todo o judiciário brasileiro.[7] Por decisão do ministro relator do processo, Edson Fachin, todos os processos sobre demarcações de terras indígenas foram suspensos até o fim da pandemia de Covid-19 ou até o julgamento final de recurso extraordinário
A AGU defendeu a tese, a qual, segundo o advogado-geral Bruno Bianco, construiu "balizas e salvaguardas para a promoção dos direitos indígenas e para a garantia da regularidade da demarcação de suas terras."[9] Já o Ministério Público Federal (MPF) manifestou-se contrariamente ao marco. O Procurador-Geral da República Augusto Aras declarou que "por razões de segurança jurídica, a identificação e delimitação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios há de ser feita no caso concreto, aplicando-se a cada fato a norma constitucional vigente ao seu tempo".[10] O ex-presidente Jair Bolsonaro também manifestou-se a favor do marco, dizendo que, caso o STF decida modifica-lo, seria "um duro golpe ao nosso agronegócio, com repercussões internas quase catastróficas, mas também lá para fora.
O primeiro voto do julgamento, dado pelo relator Edson Fachin, foi contrário ao estabelecimento de um marco. O ministro disse que a decisão da Raposa Serra do Sol, em vez de pacificar a questão, paralisou as demarcações e acirrou conflitos; declarou também que "dizer que Raposa Serra do Sol é um precedente para toda a questão indígena é inviabilizar as demais etnias indígenas". O segundo voto foi do ministro Nunes Marques, que mostrou-se favorável à tese: "Uma teoria que defenda que os limites das terras estão sujeitos a um processo permanente de recuperação de posse em razão de um esbulho ancestral abre espaço para conflitos de toda ordem sem que haja horizonte de pacificação". O julgamento foi suspenso no dia 15 de setembro de 2021, quando o ministro Alexandre de Moraes pediu vistas do processo. No dia 20 de setembro de 2023, o STF retomou o julgamento e, no dia seguinte, formou maioria para derrubar o marco temporal.
A bancada ruralista reagiu imediatamente, e prometeu tornar a derrubada nula. Segundo o vice-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, Evair de Mello, "vamos precisar tomar algumas atitudes do ponto de vista regimental. [...] Podemos obstruir as pautas do governo, podemos apresentar um texto novo e levar para o plenário. No ponto de vista do parlamento, tudo é possível"
Em outubro o Congresso aprovou em regime de urgência a Lei 14.701, que altera o texto constitucional para autorizar o princípio do marco temporal. O Ministério Público entendeu a Lei como inconstitucional e antagônica a tratados internacionais, e o presidente da república vetou seus pontos principais. O Congresso pode derrubar o veto presidencial. A Frente Parlamentar da Agropecuária publicou nota prometendo derrubá-lo. A bancada ruralista tem maioria no Congresso. Segundo Leandro Prazeres, "o embate entre o governo e os ruralistas ainda está longe de acabar".
Em 14 de novembro o Congresso derrubou com ampla maioria o veto presidencial sobre a maioria dos tópicos vetados, e também removeu várias proteções às terras indígenas: proibiu a ampliação de terras já demarcadas, autorizou atividades das forças armadas e Polícia Federal e instalação de bases militares sem consulta prévia às comunidades, e autorizou a expansão de rodovias, exploração de energia elétrica e resguardo de riquezas naturais consideradas de interesse estratégico, também sem consulta prévia. O Ministério dos Povos Indígenas anunciou que acionará a Advocacia-Geral da União para entrar com uma ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal. O deputado Pedro Lupion, representando a bancada ruralista, comemorou o resultado e disse não temer a resposta do governo, alegando ter votos suficientes para se necessário mudar o texto da Constituição a fim de sacramentar a tese do marco temporal definitivamente.
Em 28 de dezembro, os partidos PL, PP e Republicanos entraram com um pedido no STF para validar a lei que institui o marco temporal. No dia seguinte, PSOL e Rede, junto à Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), apresentaram uma ação que pede a derrubada dele. Segundo os veículos de imprensa no Brasil.
DOS ÍNDIOS
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
§ 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
§ 2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.
§ 3º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.
§ 4º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.
§ 5º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, ad referendum do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.
§ 6º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé.
§ 7º Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, §§ 3º e 4º.
Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo. De acordo com o autor Guilherme Pena de Moraes, no meu livro sobre a Constituição Federal do Brasil, e também com dados oficiais do Senado Federal.
A Constituição assegura aos povos indignas o pleno direito a sua organização social, seus costumes, suas tradições e a sua linguagem. A Constituição afirma reconhece aos povos indignas o pleno direito a diferença. Isto é. A Constituição reconhece aos povos indignas o pleno direito de serem indignas e de permanecerem como tal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário