Uma guerra comercial é um conflito econômico entre nações que impõem tarifas e outras barreiras comerciais, como cotas e restrições de importação, para prejudicar a economia do país adversário ou proteger a sua própria produção doméstica.
Como funciona
Uma guerra comercial é geralmente marcada por uma escalada de medidas protecionistas:
Início: Um país impõe tarifas sobre produtos importados do outro, justificando a medida como uma forma de proteger seus produtores e empregos.
Retaliação: O país-alvo da tarifa responde com medidas semelhantes, impondo suas próprias tarifas sobre os produtos do primeiro país.
Escalada: Esse ciclo de retaliação se intensifica, resultando em um conflito econômico mais amplo, que pode incluir outras barreiras não tarifárias (como cotas e restrições sanitárias), suspensão de contratos e restrições de compra.
Impactos e consequências
Os impactos de uma guerra comercial são amplos, afetando as economias dos países envolvidos e o mercado global:
Aumento de preços: As tarifas aumentam o custo dos produtos importados, elevando os preços para os consumidores.
Instabilidade econômica: O conflito gera incerteza geopolítica e afeta as cadeias de produção e investimentos globais.
Prejuízos para os países envolvidos: Ambos os lados podem sofrer perdas significativas. Por exemplo, produtores que exportavam para o país adversário são prejudicados pelas barreiras.
Impacto no crescimento global: A escalada de tensões comerciais pode levar à desaceleração da economia mundial. O Fundo Monetário Internacional (FMI), por exemplo, já rebaixou previsões de crescimento global por causa de conflitos comerciais.
Desvalorização cambial: A instabilidade gerada pelo conflito pode levar à desvalorização das moedas dos países afetados.
Guerra comercial entre EUA e China
A guerra comercial entre Estados Unidos e China é um dos exemplos mais notáveis da história recente. Ela se intensificou a partir de 2018, com a imposição de tarifas mútuas sobre bilhões de dólares em produtos.
A disputa envolveu setores como tecnologia, agricultura e outros bens manufaturados.
Ambos os países enfrentaram desafios econômicos e não houve um vencedor claro nesse conflito. Segundo os Jornalistas e Mestres Carla de Oliveira Tozo e Edson Rossi, no Sexto e Sétimo Periodos da Habilitação em Jornalismo na Comunicação Social, pelas Faculdades Intregradas Alcantara Machado (FIAAM FAAM).
Confira o artigo da autora Manuela de Souza Silva Faria na Revista Insper.
Insper
Ciências Econômicas
Manuela de Souza Silva Faria
Guerra comercial entre Estados Unidos e China e seus impactos: o caso da soja brasileira
São Paulo
2022
Manuela de Souza Silva Faria
Guerra comercial entre Estados Unidos e China e seus impactos: o caso da soja brasileira
Monografia apresentada ao curso de Ciências
Econômicas, como requisito parcial para a obtenção do
Grau de Bacharel do Insper Instituto de Ensino e
Pesquisa.
Orientador: Prof. Darcio Genicolo Martins – Insper
São Paulo
2022
Faria, Manuela de Souza Silva.
Guerra comercial entre Estados Unidos e China e seus impactos: o caso da soja
brasileira
Manuela de Souza Silva Faria – São Paulo, 2022. 33 f.
Monografia – Insper, 2022.
Orientador: Darcio Genicolo Martins.
1. Guerra Comercial. 2. Soja. 3. Método de diferenças em diferenças
Manuela de Souza Silva Faria
4
Guerra comercial entre Estados Unidos e China e seus impactos: o caso da soja brasileira
.
Monografia apresentada ao curso de Ciências
Econômicas, como requisito parcial para a obtenção do
Grau de Bacharel do Insper Instituto de Ensino e
Pesquisa.
Orientador: Prof. Darcio Genicolo Martins – Insper
Banca Examinadora
_____________________________________
Darcio Genicolo Martins
_____________________________________
Paulo Ribeiro
Resumo
Desde o começo de 2018, os Estados Unidos e a China estabeleceram uma disputa
comercial intensa, caracterizada fortemente pela implementação de medidas
protecionistas de ambas as partes. Em uma dessas medidas, a China elevou em 25% a
tarifa sobre as exportações de soja dos EUA, favorecendo o mercado de soja brasileiro.
O objetivo do artigo é estimar os efeitos da guerra comercial entre Estados Unidos e China
na produção e exportação de soja brasileira. Espera-se que com a alteração nos padrões
mundiais de importação, o preço brasileiro de exportação aumente e, levando-se em conta
que a oferta brasileira não é completamente elástica, levaria a um aumento da produção.
Como consequência, espera-se também um aumento na exportação, principalmente com
a China, suprindo as necessidades do país. De 2017 a 2020, observou-se um aumento de
13% na quantidade de soja exportada em kg do Brasil para a China, de acordo com a UN
Comtrade. O estudo tem como objetivo estimar os efeitos da guerra comercial entre
Estados Unidos e China na produção e balança comercial da soja brasileira utilizando o
método econométrico de diferenças em diferenças.
Palavras-Chave: 1. Guerra Comercial; 2. Soja; 3. Método de diferenças em diferenças
6
Sumário
1. Introdução .............................................................................................................. 7
1.1. Evolução da relação dos Estados Unidos, China e Brasil no complexo de soja 8
1.2. Guerra comercial entre EUA e China .................................................................. 13
2. Revisão da Literatura ........................................................................................... 16
3. Metodologia empírica .......................................................................................... 20
3.1. Dados ............................................................................................................... 20
3.2. Metodologia Empregada .................................................................................. 23
3.3. Estimação ......................................................................................................... 27
4. Resultados ............................................................................................................ 29
5. Conclusão: ........................................................................................................... 30
6. Referências Bibliográficas ................................................................................... 32
1.
Introdução
7
Em março de 2018, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou
tarifas de 25% para o aço e 10% para o alumínio importado de todos os países. O objetivo
do governo era de reduzir seu déficit comercial e proteger a competitividade econômica.
Em abril, a China, maior produtora de aço e alumínio do mundo, emitiu um memorando
impondo tarifas sobre 110 produtos americanos, incluindo a imposição de uma tarifa ad
valorem de 25% sobre a soja americana. Desde então, a administração americana impôs
quatro rodadas de elevação de tarifas, avaliado em 250 bilhões de dólares, e a China
retaliou outras três vezes, com o total avaliado em 110 bilhões de dólares (Bown, 2021).
O protecionismo americano e as consequentes retaliações chinesas afetaram a exportação
de produtos importantes na pauta exportadora brasileira, como a soja.
A China é a maior importadora de soja, alimento utilizado principalmente para
alimentação dos animais devido à grande presença de proteína e gordura. Cerca de 80%
das importações de soja na China são utilizadas para alimentação animal, enquanto 20%
são transformadas em óleo, utilizadas na cozinha por consumidores na indústria de
alimentos e processamento. O país depende fortemente da exportação vinda dos Estados
Unidos, Argentina e Brasil (USDA, 2019).
De 2000 a 2020, devido ao aumento do consumo de proteína animal no país, o uso
da soja pela China aumentou exponencialmente: suas importações da Argentina
aumentaram em 200%, dos Estados Unidos 700% e do Brasil, 2.000%. Desde 2016, o
Brasil é o maior exportador da commodity para a China já que a infraestrutura e
quantidade de área de plantio permite rápido aumento da produção. No começo de 2018,
depois da imposição da tarifa de 25% sobre a soja americana, a exportação da soja
americana para a China caiu 50% e 75% da importação chinesa passou a vir do Brasil, o
que indica que o Brasil é capaz de acomodar as demandas chinesas.
É importante entender, portanto, como a guerra comercial entre Estados Unidos e
China afeta o mercado de soja brasileira, podendo impactar diretamente a balança
comercial do país devido à importância do agronegócio. Para isso, esse trabalho se propõe
a fazer um estudo sobre as mudanças no padrão de comércio de soja entre Brasil e China
antes do início das imposições das tarifas e após sua suspensão. Buscar-se-á avaliar os
impactos principalmente sobre a produção e exportação desta commodity na economia
brasileira.
1.1.
8
Evolução da relação dos Estados Unidos, China e Brasil no complexo de
soja
A soja é o 52° produto mais comercializado no mundo, de acordo com o Observatory
of Economic Complex (OEC), evidenciando sua importância no comércio mundial. É
altamente utilizado pelo agronegócio, indústria química e de alimentos. Para compreender
seu comércio, é importante entender a relação entre os 3 maiores players neste mercado:
China, como o maior importador, e Estados Unidos e Brasil, os maiores exportadores.
A figura 1 evidencia a grande concentração do mercado de soja global. Na safra de
2016/2017, anterior à guerra comercial, os Estados Unidos e o Brasil juntos foram
responsáveis por 83% das exportações da commodity. Das exportações americanas, 61%
foram destinadas à China, 19% a outros países asiáticos, 8% para Europa, 7% para o
México e 5% para outros países. Em relação ao Brasil, 77% foram destinadas à China,
11% para outros países asiáticos, 8% para Europa e 4% para outros países. Fica evidente,
portanto, que há uma grande relação comercial entre os 3 países.
Figura 1 – Principais exportadores de soja e destino das suas exportações (2016/2017)
Fonte: UN Comtrade (2022). Elaboração Própria.
9
De todas commodities agrícolas, a soja é a principal exportada para a China pelo
Brasil e Estados Unidos. Em 2017, 63% das exportações agrícolas para a China eram de
soja, avaliadas em US$ 12,3 bilhões e representavam apenas 20% da pauta agrícola para
outros países asiáticos (a segunda maior destinação da commodity). No Brasil, 88% das
exportações agrícolas para o país asiáticos eram soja, avaliadas em US$ 20,3 bilhões,
sendo que para a União Europeia, as exportações de soja representam 14% da pauta
agrícola destinada à região.
Gráfico 1 – Exportações de soja dos Estados Unidos para os dois maiores parceiros
comerciais (bilhões de dólares) - 2017
Outros Países Asiáticos
China
0
Fonte: Global Trade Data.
5
Soja
10
15
20
Outros produtos agrícolas
25
30
35
40
Gráfico 2 – Exportações de soja do Brasil para os dois maiores parceiros comerciais
(bilhões de dólares) - 2017
Europa
China
0
5
10
Soja
15
20
25
Outros produtos agrícolas
Fonte: Global Trade Data.
30
35
40
A produção de soja nos Estados Unidos se iniciou na década de 30 no meio-oeste
devida às condições climáticas favoráveis ao seu plantio, se tornando a segunda maior
commodity produzida no país já em 1940 (atrás apenas do milho). O plantio está
10
fortemente concentrado na região de Heartland, que compreende os estados de Ohio,
Indiana, Illinois, Iowa, Minnesota, Missouri, Nebraska, Dakota do Sul e Kentucky,
devido a fertilidade do solo e condições climáticas moderadas. Até a década de 60,
exportações americanas de soja correspondiam a 80% das exportações mundiais, caindo
para abaixo de 40% na década de 90 devido ao rápido crescimento das exportações sul
americanas (BNDES, 2004).
No Brasil, a plantação de soja se iniciou no Rio Grande do Sul em 1940, na região de
Santa Rosa. Até 1980, a produtividade brasileira da commodity apresentou crescimento
próximo à média mundial, mas consideravelmente abaixo dos Estados Unidos e
Argentina, grandes produtores de soja na época e seus principais concorrentes devido à
proximidade geográfica.
Na década de 90, marcada por avanços tecnológicos e mudanças político-sociais, o
plantio de soja com qualidade foi expandido para o Centro-Oeste, Norte e Nordeste,
permitindo a cultura da commodity em áreas tropicais e terras mais baratas. Nos anos
subsequentes, houve expressivo aumento da produção da commodity, com crescimento
acima de seus principais concorrentes, associado não apenas ao crescimento da produção,
mas também ao aumento da capacidade produtiva da soja brasileira, com avanços
científicos e disponibilização de tecnologias, como a soja transgênica, e técnicas, como o
plantio direto (EMBRAPA, 2004). Em relação à exportação, o bom desempenho do setor
está relacionado à vocação agropecuária brasileira, a modernização da atividade rural,
advinda de P&D, inovações nas indústrias de maquinários e implementos e adoção de
programas de saúde animal e vegetal, que garantem a qualidade das produções (Silva e
Machado, 2009). Durante esse período, o Brasil exportou em média 68% da sua produção.
A relação entre Brasil e Ásia teve início em 1990, com a Política Industrial e de
Comércio Exterior durante o governo Collor, que incentivava a abertura comercial. Ao
mesmo tempo, com a liberalização comercial na China, as tarifas de importações
favoreciam importações de soja; seu acordo com a OMC em 2001 diminuiu em 3% as
tarifas relacionadas à commodity (USDA, 2019). Nos anos 2000, essa relação foi
fortificada com o boom das commodities, provocado pelo aumento da demanda chinesa
por produtos primários a fim de sustentar seu elevado crescimento econômico.
Além disso, o grande crescimento populacional chinês, a urbanização e o aumento na
qualidade de vida impulsionaram o mercado de carne, principalmente o suíno, no país.
11
Consequentemente, houve aumento pela demanda pelo farelo de soja, amplamente
utilizado na alimentação dos animais. Mesmo após a crise de 2008, os produtos de soja
brasileiro sofreram aumento de preços e não sofreram impactos significativos já que (i)
se trata de um produto menos sensível à renda, (ii) o consumo chinês e indiano se manteu
firme durante a crise e (iii) houve queda de produção na Argentina (Cardoso et al, 2014).
Em 2009, a China se tornou o maior parceiro comercial do Brasil, sendo que a soja
corresponde a 46% da pauta exportadora do Brasil para a China.
Em relação aos EUA, a China era o maior parceiro comercial do país até 2017, ano
em que 51,7% das exportações totais americanas eram destinadas ao país asiático. O
segundo maior parceiro comercial era o México, que possuía o destino de apenas 7,5%
das exportações. Da pauta agrícola, 63% dos produtos comercializados com a China
correspondiam à soja.
A demanda chinesa por soja continua a aumentar, mesmo com uma certa estabilização
econômica do país a partir de 2010. Entre 2004 e 2018, a demanda chinesa por soja
aumentou 178,8%, enquanto a demanda mundial se elevou em 72,8% (CONTINI et al.,
2018). Grande parte da pauta de importação chinesa corresponde a produtos agrícolas,
com destaque para soja (gráfico 3). É esperado que o consumo da commodity continue a
crescer à medida que a urbanização altere os padrões de consumo dos chineses (USDA,
2019). Projeções do Ministério da Agricultura e Assuntos Rurais da China (2019)
mostram aumento da demanda por grãos de soja impulsionado pelo crescimento constante
do consumo de produtos animais, alimentos à base de soja, e suplementos nutricionais.
Gráfico 3 - Importações chinesas por categoria
37%
30%
9%
Soja
24%
Outros Produtos Agrícolas Carne Outros
Fonte: Global Trade Data.
12
Ao mesmo tempo, Brasil e Estados Unidos vem competindo pelo primeiro lugar em
produção mundial de soja nos últimos anos. Segundo a CONAB, o Brasil produziu 135
milhões de toneladas de soja na safra 2020/2021, um crescimento de 8% se comparado
ao ano anterior. Os EUA, na mesma safra, produziram 112 milhões de toneladas, uma
diminuição de 7% em relação à safra passada. Desde a safra 2017/2018, o Brasil se
consolidou como maior produtor da commodity e partir da safra de 2011/2012, se tornou
o maior exportador da soja para China, superando os Estados Unidos. Essa relação
comercial se acentua em 2016, com um grande aumento da participação no Brasil nas
importações Chinesas e declínio da participação americana, vide gráfico 4.
Gráfico 4 - Importações chinesas de soja: Porcentagem fornecida pelos Estados Unidos
e Brasil (2000-2019)
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Fonte: Global Trade Data.
Estados Unidos
Brasil
Diante de um cenário de guerra comercial entre Estados Unidos e Chinesa, é possível
inferir que as tarifas chinesas sobre a soja americana reduziriam a demanda chinesa pela
commodity produzida nos Estados Unidos já que impõe um aumento artificial nos preços
americanos para os importadores chineses. Dessa forma, há uma diminuição na
quantidade comercializada entre os dois países e a demanda chinesa de soja é deslocada
para outros países que possam acomodar essa lacuna. A exportação americana de soja
para China diminuiu de US$ 12 bilhões em 2017 para US$ 3 bilhões 1 ano depois (Bown,
2021). A grande concentração do mercado de soja mostra que o Brasil é o único país
capaz de acomodar as demandas chinesas, por já possuir uma relação sólida no comércio
13
de soja com a China e ter capacidade de expansão de produção da commodity, se tornando
o principal beneficiado do mercado de soja.
1.2. Guerra comercial entre EUA e China
Em 2016, com a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, a posição política do
país se voltou ao protecionismo. Em 2018, o vice-presidente, Mike Pence, declarou que
a China era o maior desafio para os EUA. Tal preocupação vem do fato de que desde que
a China entrou na Organização Mundial de Comércio (OMC) em 2001, sua influência no
comércio mundial vem aumentando, sendo que 40% das exportações mundiais em 2020
tem como origem a China (García, 2020), o que criou um déficit comercial nos EUA de
400 bilhões de dólares.
Em agosto de 2017, a agência federal norte-americana, Office of the United States
Trade Representative (USTR), foi instruída a iniciar uma investigação, através da Seção
301, contra práticas comerciais alegadamente não razoáveis ou discriminatórias da China.
O governo americano acreditava que as ações chinesas prejudicavam os direitos de
propriedade intelectual, inovação e desenvolvimento tecnológico de seu país.
Em março de 2018, o governo do Trump publicou um relatório que indicava que
quatro práticas chinesas justificavam uma ação ao abrigo da Secção 301 das Leis de Tarifa
e Comércio de 1974: (i) transferência forçada de tecnologia, através de formações de
joint-ventures; (ii) ações cibernéticas para aquisição ilegal de VoIP e segredos comerciais
dos EUA; (iii) discriminações e práticas de licenciamento não comerciais; e (iv) aquisição
estratégica de bens norte-americanos financiada pelo Estado chinês. Dessa forma, é
possível perceber que o posicionamento do governo americano era reflexo de três
principais preocupações: (i) de que o superavit comercial chinês aumentaria o
desemprego americano; (ii) China poderia ameaçar a posição internacional dos EUA e
(iii) medo da China estar utilizando práticas ilegais para conseguir tecnologia americana
a baixo custo (Liu et al, 2018).
A USTR determinou que impor tarifas no valor aproximado de US$ 50 bilhões seria
uma resposta apropriada. Assim, a primeira medida norte-americana foi a Seção 232, uma
tarifa de 25% para o alumínio e 10% para o aço, imposta para diversos países em julho
de 2018. A China, como maior produtor mundial de aço e alumínio, retalia impondo
14
tarifas de 25% em 545 produtos americanos, principalmente commodities agrícolas,
incluindo a soja. Em seguida, Donald Trump exige uma modificação na Seção 301,
impondo tarifas adicionais contra importações chinesas no valor de US$ 250 bilhões por
acreditar que a imposição inicial não foi o suficiente já que a administração chinesa se
recusava a mudar suas práticas. A China retaliou impondo tarifas no valor de US$ 75
bilhões. Até setembro de 2018, a média de tarifas norte-americanas em produtos chineses
aumentou de 3,1% (nível pré-disputa) para 12% cobrindo cerca de metade das
importações. A média de tarifas chinesas aumentou de 8% para 18,3%, cobrindo cerca de
2/3 dos produtos americanos importados (Bown, 2021).
Após uma reunião do G20 em dezembro de 2018, o presidente americano, Donald
Trump, e o vice-primeiro ministro chinês, Liu He, assinaram um acordo de trégua de 90
dias, dando início a um período de negociações mais sérias. Contudo, tais negociações
foram interrompidas depois de uma viagem de um agente da USTR, Robert Lighthizer, a
Beijing. A escalação de tarifas foi retomada: EUA tarifou em 15% cerca de US$ 101
bilhões de importações chinesas, seguida por retaliação da China.
Os produtos que sofreram imposição ou aumento de tarifa durante 2018 e 2019 eram
de setores diversos. Em relação aos produtos chineses, a maior parte de produtos
intermediários (cerca de 80%) sofreram tarifas de 25%, enquanto os produtos de vestuário
sofreram tarifas de 10 a 15% e a maior parte dos brinquedos e equipamentos esportivos
não sofreram nenhum tipo de imposição de tarifa. Entretanto, os produtos americanos
taxados pelos chineses focaram quase que inteiramente em itens agropecuários e frutos
do mar, como soja, porco e lagosta. O país evitou taxar produtos chave, como condutores
e semi-condutores (Bown, 2021).
Durante este período, a China entrou em disputa na OMC contra os Estados Unidos,
alegando que o país americano estaria violando regras da instituição. Em setembro de
2020, a OMC emitiu relatório favorável à China no contencioso DS543, com a
justificativa de que “os Estados Unidos não forneceram evidências, ou explicações
suficientes, para apoiar sua alegação de que as medidas eram necessárias para proteger as
‘normas do bem e do mal’ evocadas por eles e que foram consideradas uma questão de
moral pública nos Estados Unidos”.
Em janeiro de 2020, Donald Trump e Liu He assinaram a fase 1 do Acordo Comercial.
O ponto central do acordo é o comprometimento chinês de importar mais US$ 200 bilhões
15
em produtos americanos ao longo de dois anos para reduzir o déficit comercial bilateral
com os norte-americanos que chegou a US$ 420 bilhões em 2018. Em relação a
agricultura, tarifas sobre carne, frutos do mar e biotecnologia foram retiradas, entretanto
a da soja será mantida até a Fase 2 do acordo, que está prevista para acontecer em 2022.
Até dezembro de 2021, a China importou cerca de US$ 150 bilhões de produtos
americanos, 25% a menos do que o prometido na primeira fase do acordo e o déficit
comercial foi de cerca de US$ 350 bilhões. Sarah Bianchi, Vice-Representante da USTR,
declarou que “estava claro que os chineses não cumpriram sua parte do acordo e é algo
que eles (USTR) estariam tentando resolver”. Ao mesmo tempo, a embaixada chinesa em
Washington declarou que a China estava fazendo seu melhor, diante do cenário imposto:
pandemia, recessão global e disrupções na cadeia de suprimentos. É possível inferir que
a resolução do conflito ainda está longe de ser concluída.
2. Revisão da Literatura
16
Diversos estudos foram publicados desde o início das imposições das tarifas de
importação com o objetivo de analisar os resultados de uma guerra comercial. Cenários
diferentes foram levantados de acordo com a data de publicação e situação das políticas
comerciais. Mas todos apresentam resultados semelhantes, como queda no bem-estar dos
Estados Unidos e China, maior queda de produção no setor agrícola americano e ganho
do setor agrícola brasileiro.
O primeiro trabalho apresentado sobre o tema de Ciuriak e Xiao (2018) estuda os
impactos da primeira disputa comercial firmada, a tarifa de 25% para o alumínio e 10%
para o aço (também chamada de Seção 232), imposta pelos Estados Unidos para diversas
regiões, entre elas China e União Europeia. A simulação foi feita a partir do modelo de
equilíbrio geral computável utilizando dados da base de dados GTAP (Global Trade
Analysis Project). Como principais resultados descobriram uma queda real no PIB
americano de 0,06% e redução no bem-estar, sendo o Canadá o país que sofreria o maior
impacto negativo no PIB. Os outros países não seriam afetados pois a perda de
competitividade dos Estados Unidos seria compensada pelo ganho de produtividade em
outras regiões, como a própria China.
Utilizando a mesma metodologia, Amiti et al (2018), avaliam o impacto nos preços
domésticos e bem-estar dos Estados Unidos no curto prazo através de dados mensais de
janeiro a dezembro de 2018. Os autores realizam uma estimativa do valor das tarifas e
suas consequências para o valor e quantidade de importação e a perda de bem-estar devido
ao peso morto. Os resultados apontam que, no curto prazo, as mudanças em tarifas são
quase completamente passadas para os preços domésticos, assim, não há mudança no
preço de exportação.
17
Ribeiro (2018) apresentou o primeiro estudo brasileiro do tema avaliando as
consequências dos impactos da Seção 232 para o Brasil referentes à tarifa de 25% para o
aço. O alumínio não é considerado no trabalho pois é uma parte pequena da pauta de
exportação brasileira. Através de um modelo de equilíbrio geral computável, utilizando
dados da base da GTAP (Global Trade Analysis Project), encontra que a perda de
exportação de aço seria de 13%, enquanto o PIB se manteria inalterado.
Carvalho et al (2019), utilizando a mesma metodologia de Ribeiro (2018),
simularam os efeitos da guerra comercial entre EUA e China sobre a economia brasileira,
com ênfase em alumínio, aço e soja. Foram estudados dois cenários: um em que os
Estados Unidos tarifam unilateralmente outros países e outro que a China retalia os EUA.
Seus resultados apontam aumento na produção de soja (9,3%) e aço (2,47%) no Brasil e
redução no setor de alumínio (-0,28%) no segundo cenário. EUA e China apresentam
redução de bem-estar em ambos os cenários (com a China sendo a maior perdedora),
enquanto o Brasil ganha com ambos os cenários, especialmente no segundo. O objetivo
do governo americano seria alcançado, com aumento da produção de aço e alumínio e
redução pequena no déficit comercial.
Outros estudos buscaram analisar as consequências para setores específicos que
sofreram impactos pela guerra comercial. Adjemian et al (2021) estudaram as mudanças
nos preços do mercado de soja internacional. Utilizando o modelo de Relative Price of a
Substitute (RPS) e fazendo uso de dados diários de 2013 a 2020, encontraram que o preço
de exportação da soja americana está 0,74 dólares/alqueire mais baixo e o preço brasileiro
está 0,97 dólares/alqueire mais alto do que estaria sem a presença de uma tarifa, indicando
o favorecimento do mercado brasileiro no setor.
Outra variável importante de ser medida em relação à produção de commodities
agrícolas é a área plantada. Wu et tal (2020), buscando estudar os impactos no mercado
18
de soja, analisaram tal variável nos Estados Unidos e Brasil. Para tal, utilizaram um
modelo dinâmico de uso da terra com dados de 2010 a 2018. Conclui-se que há impacto
negativo na área plantada nos EUA e aumento da área plantada no Brasil, indo de
encontro aos resultados publicados por Adjemian et al (2021).
Na mesma linha de pensamento, Taheripour e Tyner (2018), analisam os possíveis
impactos de uma ameaça chinesa de imposição da tarifa de 25% sobre o mercado
internacional de soja e outras commodities agrícolas. Utilizando o modelo de GTAP,
concluem que a importação chinesa de soja americana diminuiria 17 milhões de toneladas
no longo prazo, enquanto a exportação de soja brasileira para a China aumentaria de 18 a
36%.
Observa-se que ao longo do início da guerra comercial, diversos autores buscaram
analisar possíveis efeitos em relação aos diferentes players e produtos que sofreram
imposição de tarifas utilizando diferentes metodologias e analisando diversas variáveis,
como níveis de exportação e produção, preço e bem-estar. Percebe-se que há conclusões
em comum: EUA e China apresentam perda de bem-estar, enquanto o Brasil é
beneficiado, sobretudo em cenários de retaliação chinesa, através de aumentos de
exportação de commodities, principalmente da soja.
Contudo, como os eventos analisados são recentes, a maior parte dos estudos já
publicados partiram de simulações sobre as possíveis consequências da guerra comercial.
Muitos deles se baseiam apenas na imposição da primeira tarifa, Seção 232, ou da
primeira rodada de imposições, partindo, assim, de suposições sobre a política comercial
chinesa e americana e criação de possíveis cenários. Com a disponibilidade de dados mais
recentes, que podem indicar o que efetivamente aconteceu, e conclusão (até então) de
rodadas de imposições tarifárias, o presente trabalho busca analisar os impactos ex-post
sobre a soja brasileira, seus níveis de exportação, produção e impactos sobre a área
19
plantada e colhida. É utilizado o método econométrico de diferenças em diferenças, uma
metodologia diferente da tradicional usada na área, que busca averiguar o efeito de um
choque sobre a variável tratamento em relação a um grupo de controle.
3. Metodologia empírica
20
3.1.
Dados
Nesta seção são apresentados os dados e metodologia empírica empregada para
identificar as mudanças na soja brasileira. Pretende-se analisar dois impactos da guerra
comercial entre Estados Unidos e China sobre a soja brasileira: na produção e exportação.
Em relação à produção, serão analisadas três variáveis: área plantada, área colhida
e quantum produtivo. Os valores foram coletados da base de dados do IBGE de forma
mensal e compreendem o período de setembro de 2015 a março de 2022.
Gráfico 5 – Área Plantada de Soja (em milhões de hectares) – 2016 a 2022
45
40
35
30
25
20
set-15 mar-16 set-16 mar-17 set-17 mar-18 set-18 mar-19 set-19 mar-20 set-20 mar-21 set-21 mar-22
Fonte: IBGE (2022)
Em relação à área plantada de soja, percebe-se a tendência linear positiva da
variável, apresentando um crescimento maior de 2020 a 2021. De setembro de 2016 a
setembro de 2021, o crescimento foi de 17%. O estado do Mato Grosso é o maior produtor
de soja do Brasil, dos 20 maiores munícipios em área plantada da commodity no Brasil,
13 estão localizados no MT. Com a expansão da fronteira agrícola, há tendências de
aumento da área plantada em regiões do cerrado, com destaque para a região do Matopiba
(Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia). Devido à boas condições climáticas e emprego de
tecnologias adequadas, é esperado crescimento positivo na área plantada.
Gráfico 6 – Área Colhida de Soja (em milhões de hectares) – 2016 a 2022
21
45
40
35
30
25
Fonte: IBGE (2022)
O segundo gráfico mostra a evolução da área colhida de soja. A grande expansão
de área colhida se deu de forma intensiva, com a incorporação de terras férteis,
mecanização e avanço tecnológico. A região do Matopiba é a grande responsável pelo
crescimento de área colhida nos últimos anos do Brasil, com destaque para região oeste
da Bahia. O Brasil utiliza atualmente cerca de metade da área disponível para colheita,
evidenciando o potencial existente de crescimento da produção no país. Apenas no
Matopiba, é estimado o potencial de utilização de 5 milhões de hectares de terra (BNDES,
2004). Novamente, 2020 a 2021 é o período em que a variável apresenta o maior
crescimento. Dentro dos anos analisados, também houve um crescimento de 17%.
Gráfico 7 – Produção em toneladas – 2016 a 2022
140
130
120
110
100
90
80
70
60
Fonte: IBGE (2022)
22
A produção de soja teve um crescimento de 40% no período analisado, atingindo
um pico em janeiro de 2020 devido à boas condições climáticas. O bom desempenho da
produção da commodity está relacionado aos avanços tecnológicos em: (i) genética, que
permitiu a melhoria de sementes e plantas mais saudáveis e produtivas, como a soja
transgênica; (ii) maquinário agrícola, facilitando os processos de plantio, manutenção e
colheita e (iii) técnicas agrícolas, com aumento de produtividade e eficiência, reduzindo
as perdas e permitindo variedades de soja adequadas ao cerrado (BNDES, 2004).
Dados de exportação foram retirados da UN Comtrade e compreendem o período
de 2014 a 2021 no formato anual. Duas variáveis serão analisadas: exportações em kg e
valor das exportações em dólares. De acordo com a Tabela 1, percebe-se que o período
com maior exportação de soja ocorreu em 2018, ano de início da disputa comercial. Neste
ano, a exportação aumentou em 27%, em comparação ao ano anterior.
Tabela 1 – Exportação de soja
Ano
Em toneladas
(milhões de kg)
US$ (milhões)
2014
32.664
16.615
2015
2016
2017
2018
2019
2020
2021
40.926
38.564
53.797
68.557
57.963
60.596
60.476
15.788
14.386
20.310
27.233
20.452
20.903
27.208
Fonte: UN Comtrade (2022)
Optou-se por utilizar a forma logarítmica das variáveis pela melhor compreensão
dos resultados da estimação do modelo. A tabela 2 apresenta as principais descritivas das
variáveis analisadas já transformadas pelo logaritmo.
Tabela 2 – Descritiva das variáveis
23
Em milhões
Média
Mediana
Mínimo
Quantum Produtivo
Máximo
115,07
114,97
95,75
Área Colhida 35,49 34,91 32,06 40,44
134,93
Área Plantada 35,54 34,97 32,08 40,54
Exportação (em
toneladas de kg)
51.692,84
Exportação (US$)
20.361,99
55.880,23
20.381,27
32.664,32
14.386,11
68.556,61
Fonte: Elaboração Própria
27.233,07
3.2.
Metodologia Empregada
A fim de analisar o impacto da soja brasileira devido à guerra comercial entre
Estados Unidos e China, será utilizada a metodologia de diferenças em diferenças (diff
in-diff). Essa metodologia foi empregada pela primeira vez em Ashenfelter e Card (1985)
que buscaram avaliar o impacto de programas de treinamento no rendimento dos
trabalhadores.
Neste método, é necessário a utilização de dois grupos: o de tratamento, afetado
pela mudança, e o de controle, não afetado. É necessário que ambos estejam sujeitos às
mesmas influências para que o efeito na produção e exportação da soja possa ser
identificado e isolado a partir da comparação entre eles.
Para identificar o efeito causal da intervenção, o método se baseia em um conjunto
de hipóteses. A primeira é de que a evolução do grupo tratamento corresponda a do
controle na ausência do choque. Para tal, é realizado o teste de tendências paralelas para
garantir que ambos reagiam de forma similar aos fatores que estão expostos anteriormente
à intervenção e dessa forma, na ausência do evento, as tendências do grupo controle e
tratamento seriam a mesma. A segunda hipótese é de que a composição de ambos os
grupos não se altere drasticamente ao longo do tempo. Por último, o método exige que o
grupo tratamento ou controle não sofram mudanças heterogêneas ou que choques
macroeconômicos tenham efeito diferenciado sobre cada um. Caso alguma das hipóteses
não seja cumprida, o método de diferenças em diferenças captará tais efeitos e atribuirá
24
erroneamente aos efeitos do choque e o efeito causal sobre o grupo tratamento não será
capturado corretamente.
O procedimento diff-in-diff possui uma série de vantagens. Primeiramente, ele é
capaz de lidar com características não observáveis da base de dados que são invariantes
ao longo do tempo. O método possui grande aplicabilidade e é amplamente utilizado em
situações de “experimento natural” – situação em que um evento com pouca
previsibilidade de acontecer provoca a composição de grupos de tratamento e de controle.
Como mencionado anteriormente, o método não garante por si só que o grupo
controle é significativo ao de tratamento, portanto, de acordo com Fogel (2012), é
necessário garantir que o grupo controle está sujeito aos mesmos fatores que afetam o
tratamento e que as trajetórias de ambos os grupos antes do início da disputa comercial
sejam parecidas. Assim, este trabalho apresentará o milho como grupo controle. Tanto a
soja quanto o milho são commodities, portanto, apresentam as mesmas influências e em
geral, são afetadas pelas mesmas condições macroeconômicos e meteorológicas já que
são produzidos nos mesmos estados e em grande parte, pelos mesmos produtores. Além
disso, ambos respondem por quase 80% da produção de grãos do país. A diferença entre
as duas commodities está no destino de sua produção já que o milho é destinado ao
mercado interno, principalmente para a indústria de ração animal, enquanto a soja é
majoritariamente destinada às exportações (Embrapa, 2015). Enquanto cerca de 18% do
milho é exportado, mais de 70% da produção de soja se destina ao mercado externo. Além
disso, apenas 0,2% da exportação brasileira de milho é destinada à China pois o país já é
o 2° maior produtor, assim não possui grande demanda de importação. Tais características
conferem o milho como um bom grupo de tratamento em relação à soja.
Para melhor compreender a relação entre o milho e a soja, foram feitos testes de
correlação entre as variáveis. A tabela 3 apresenta o resultado dos coeficientes de
correlação anteriormente e posteriormente à imposição das tarifas. Houve um grande
aumento nos coeficientes de área plantada e área colhida (de 0,54 para 0,98 e 0,62 para
0,98, respectivamente) indicando forte associação positiva depois do choque. Em
contrapartida, quantum produtivo sofreu uma grande redução em seu coeficiente de
correlação, de 0,79 para 0,17, demonstrando pouca relação entre soja e milho após julho
de 2018.
Tabela 3 – Correlação entre milho e soja
25
Fonte: Elaboração Própria
Como forma de compreender as relações das duas commodities anteriormente ao
choque e garantir as hipóteses do modelo de que a evolução da soja seria a mesma do
milho na ausência da imposição da tarifa, foram realizados testes gráficos de trajetórias
lineares. O objetivo de realização destes testes é garantir que no período pré-evento, as
variáveis de ambas commodities se comportavam de forma semelhante e dessa forma, o
diff-in-diff consiga capturar o efeito causal da tarifa sob a soja brasileira. No gráfico 8,
nota-se que anteriormente ao choque de elevação da tarifa da soja americana em julho de
2018, soja e milho apresentavam tendências similares: houve queda da produção em abril
de 2016 seguida de recuperação em novembro do mesmo ano para ambas commodities.
Gráfico 8 – Produção em milhões de toneladas de milho e soja – set/2015 e a jul/2018
Fonte: IBGE (2022). Elaboração Própria.
Os gráficos lineares da área plantada e área colhida são muito semelhantes já que
as duas variáveis são muito correlacionadas. Apesar de no final de 2016 a área colhida de
milho ter tido um aumento que não foi acompanhada pela soja, anteriormente ao choque,
as variáveis apresentavam trajetória semelhante com crescimento estável. Em relação a
área plantada de milho, a commodity apresentou uma queda em fevereiro de 2018, que
26
não foi acompanhada pela soja (vide gráfico 10), mas é possível atribuir tal
comportamento à efeitos sazonais já que, rapidamente, voltou a níveis normais.
Gráfico 9 – Área Colhida em milhões de hectares de milho e soja – set/2015 e a jul/2018
38
33
28
23
18
13
8
ago-15
jan-16
jun-16
Fonte: IBGE (2022). Elaboração Própria.
nov-16
Soja
abr-17
Milho
set-17
fev-18
jul-18
Gráfico 10 – Área Plantada em milhões de hectares de milho ex’ soja – set/2015 e a
jul/2018
40
35
30
25
20
15
10
ago-15
jan-16
jun-16
nov-16
Fonte: IBGE (2022). Elaboração Própria.
Soja
abr-17
Milho
set-17
fev-18
jul-18
3.3.
Estimação
27
São feitas duas subtrações no modelo. A primeira é a diferença das médias das
variáveis do grupo controle e tratamento antes e depois do choque. A segunda se refere à
diferença verificada entre as diferenças calculadas anteriormente.
Há um grupo de tratamento S e um grupo controle M. Há um período pré-evento
para o grupo de tratamento, pré (S), e um período pós-evento para o grupo de tratamento,
pós (S); um período pré-evento para o grupo de controle, pré (M), e um período pós
evento para o grupo de controle, pós (M). Dessa forma:
𝑆𝑀
2𝑥2 = ( 𝑦𝑆
𝑝ó𝑠(𝑆) − 𝑦𝑆
𝑝𝑟é(𝑆)) − ( 𝑦𝑀
𝑝ó𝑠(𝑀) − 𝑦𝑀
𝑝𝑟é(𝑀))
Em que 𝛿𝑆𝑀
2𝑥2 é a média do efeito do grupo tratamento no controle e y é a média da
amostra para o grupo em particular durante o período calculado. O primeiro parênteses
diferencia o grupo de tratamento S e o segundo parênteses diferencia o grupo controle M
e após isso, é diferenciado o primeiro termo do segundo.
Em termos condicionais, podemos rescrever a equação acima dado que: Se
T={1,0} é definido como a commodity sendo tratada – soja ou milho – e t={0,1} é
definido como o período posterior ou anterior ao choque, o estimador de diff-in-diff é
dado por:
𝐷𝐷 = {𝐸[𝑌|𝑇 = 1,𝑡 = 1]−𝐸[𝑌|𝑇 = 1,𝑡 = 0]}−{𝐸[𝑌|𝑇 = 0,𝑡 = 1]−
𝐸[𝑌|𝑇 = 0,𝑡 = 0]}
Assim, a diferença entre a variação de fato observada para o grupo de tratamento
e a variação fornecida pelo grupo de controle capta os efeitos causais do choque.
É possível demonstrar a estimativa por meio de uma regressão linear, como
demonstrado a seguir:
= 𝛽0+𝛽1×𝑝𝑒𝑟í𝑜𝑑𝑜+ 𝛽2×𝑡𝑟𝑎𝑡𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜+ 𝛽3 ×𝑝𝑒𝑟í𝑜𝑑𝑜 ×𝑡𝑟𝑎𝑡𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜+ 𝑒𝑖
Onde período é uma dummy, admitindo o valor de 1 para meses posteriores a
julho de 2018, a data do choque, e 0 para meses anteriores a julho de 2018. Tratamento
também é uma dummy que representa qual commodity é a varíavel sendo analisada,
adotando o valor de 1 se tal produto se refere a soja. Serão necessárias cinco regressões
diferentes, com quatro variáveis respostas diferentes (Y), a primeira se referindo ao
28
quantum produtivo; a segunda à área plantada; terceira à área colhida; exportação medida
em kg e por último, exportação medida em dólares.
Desta forma, 𝛽0 é o resultado médio do grupo de controle no período anterior ao
choque e 𝛽0 +𝛽1 é o resultado médio do grupo de controle no período posterior ao
choque. 𝛽2 se refere à diferença entre o grupo tratamento e de controle no período anterior
ao choque, enquanto 𝛽3 é a estimativa do diff-in-diff. 𝛽0 + 𝛽2 é o resultado médio do
grupo de tratamento no período anterior ao choque e 𝛽0 + 𝛽1 + 𝛽2 + 𝛽3 é o resultado
médio do grupo de tratamento no período posterior do choque.
Os procedimentos econométricos foram realizados no Stata. Em relação ao milho,
foram somados os valores referentes à primeira safra e segunda safra da commodity,
como divulgadas pelo IBGE, já que a primeira safra é plantada no verão e a segunda, se
refere à safrinha ou safra de inverno plantada em determinados estados. Dessa forma,
anualiza-se os valores da produção do milho.
4. Resultados
29
A tabela 4 apresenta os resultados da regressão transformadas por logaritmo.
Analisando as 5 regressões feitas, percebe-se que o coeficiente de soja e o coeficiente de
diferenças em diferenças, 𝛽3, apresenta valores positivos e significantes (todos estão
abaixo de 5% de significância). Assim, na primeira e segunda regressão, após a imposição
de tarifa em julho de 2018, o valor da exportação em kg e em dólares de soja aumentou.
Em relação às variáveis de produção, área plantada, colhida e quantum produtivo,
percebe-se o mesmo comportamento: dado que o coeficiente de diff-in-diff é positivo e
significante, após a imposição da tarifa, o resultado das variáveis sofreu um aumento em
relação ao milho e ao período anterior à tarifa.
Tal resultado implica que após a imposição da tarifa, medida pela variável “dummy
ano”, a China perde grande parte do suprimento da soja. Dessa forma, o preço da
commodity é elevado, como pode ser evidenciado pela variável Exportação Valor, que
mede o nível de preços no mercado. O Brasil, como já era esperado, possui as capacidades
naturais e de produção devido às grandes fazendas produtoras de soja de suprir as
necessidades do mercado chinês, dessa forma elevando sua área plantada e área colhida
e, consequentemente, seu quantum produtivo. Grande parte desse montante é destinado
ao país asiático, elevando também a variável Exportação kg, que mede a quantidade
exportada de soja à China.
Assim, a imposição da tarifa sobre a soja americana pela China trouxe resultados
positivos para a produção e exportação da soja brasileira.
Tabela 4 – Resultados da regressão
Variável
Exportação
(Kg)
Exportação
(Valor)
Área
Plantada
Área
Colhida
Quantum
Produtivo
Dummy
Soja
Dummy
Ano
Diff-in-Diff
Intercepto
10,62***
7,57
10,32***
7,96
10,23***
5,90
9,79**
7,23
5,90***
7,40
6,43**
6,92***
7,23***
6,24***
6,24***
7,21***
7,34***
7,04***
6,68**
7,93***
Significância: *** <1%; ** < 5%; * < 10%
Fonte: Elaboração Própria (2022).
5. Conclusão
30
Os resultados apresentados pelo método de diferença em diferença atenderam às
expectativas de aumento da produção e exportação da soja após o início da guerra
comercial entre Estados Unidos e China. Devido à criação artificial de um preço maior
da soja americana exportada pela China – pela imposição das tarifas de importação -, o
preço brasileiro da commodity apresenta vantagem comparativa. O Brasil possui uma
vocação natural ao setor agropecuário devido à boas condições climáticas e além disso, o
setor passou por grande modernização, com grandes investimentos em Pesquisa &
Desenvolvimento, além de inovações nos bens de capitais, o que permitiu produções com
qualidade e em terras mais baratas.
Apesar da China apresentar uma certa estabilização econômica nos últimos anos,
ainda é esperado que sua população, que está se tornando cada vez mais urbana, passe a
demandar maiores quantidades de soja pelo aumento de consumo de carnes. Com o menor
fluxo de exportações de soja dos Estados Unidos para a China, outro player precisaria
suprir as necessidades do país asiático. Pelas razões anteriormente citadas e pelas relações
comerciais já firmes entre Brasil e China, principalmente no setor agropecuário, o Brasil
possui capacidade de aumento da produção de soja e consequente aumento de fluxo de
exportação da commodity, substituindo parte da parcela de exportação dos Estados
Unidos e suprindo a demanda reprimida.
Como comprovado por estudos anteriores, há uma perda de bem-estar geral
devido às imposições da tarifa já que se trata de uma medida artificial que modifica as
relações de equilíbrio de preço e quantidade de diversos produtos, como o aço, alumínio,
soja e seus derivados. Não apenas os dois países envolvidos diretamente no conflito são
afetados, as relações mundiais também sofrem modificações e consequentemente, há
impactos sobre os padrões de produção e exportação e a balança comercial de diferentes
players. Contudo, o Brasil é beneficiado em tal situação no mercado de soja. O coeficiente
de diferenças em diferenças das variáveis de produção e exportação de soja brasileira são
estatisticamente significantes o que comprova que há ganhos para o mercado de soja no
Brasil com a guerra comercial entre Estados Unidos e China.
Como sugestão para estudos posteriores, seria interessante o uso de um modelo
econométrico que dependa unicamente do comportamento da soja para medir seus efeitos
31
na guerra comercial entre Estados Unidos e China. Dessa forma, sugere-se aplicar o
método do controle sintético, que recria o desempenho da soja na ausência da imposição
das tarifas e ao comparar com o que de fato aconteceu, permite criar conclusões sobre os
efeitos sob a soja. O controle sintético pode ser utilizado como um método para melhorar
a análise feita já que não é necessário atender as hipóteses do método de diferenças em
diferenças, como a de trajetória paralela das variáveis do grupo tratamento e controle.
6. Referências Bibliográficas
32
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As recentes tarifas impostas pelos Estados Unidos, especialmente durante o governo Trump, têm gerado diversos efeitos na economia brasileira, impactando o comércio exterior, o Produto Interno Bruto (PIB) e o emprego. No entanto, os efeitos variam e também podem abrir novas oportunidades para o Brasil, como a busca por novos mercados e um possível impulsionamento em certos setores agrícolas. Segundo a Revista Insper.
Impactos negativos
Queda no PIB: A implementação das tarifas pode causar uma queda significativa no PIB brasileiro, impactando setores e pressionando a economia nacional. Um estudo da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg) previu uma redução de R$ 25,8 bilhões no PIB em até dois anos após a imposição do "tarifaço".Segundo a Revista Insper.
Redução das exportações: As tarifas de 50% sobre alguns produtos brasileiros, formalizadas em decreto em julho de 2025, reduziram as exportações do Brasil para os EUA. Após o anúncio, as exportações brasileiras para os EUA caíram 18,5% em agosto de 2025 em relação ao mesmo período do ano anterior. Segundo a Revista Insper.
Prejuízos em setores específicos: Setores como o de calçados foram prejudicados pelas tarifas, resultando em menor lucro para as empresas. As sobretaxas impactaram particularmente itens como café não torrado, carne bovina e equipamentos de engenharia civil. Segundo a Revista Insper.
Perda de empregos: As tarifas podem levar à perda de postos de trabalho. A Fiemg estimou a perda de 146 mil empregos, entre formais e informais, além de uma redução na renda das famílias. Segundo a Revista Insper.
Pressão inflacionária: A imposição de tarifas, especialmente se houver retaliação por parte do Brasil, pode levar a um aumento da inflação, afetando o poder de compra da população. Segundo a Revista Insper.
Oportunidades e adaptações
Busca por novos mercados: Com as tarifas travando as exportações para os EUA, o Brasil se viu obrigado a buscar novos mercados para seus produtos, o que pode diversificar sua pauta exportadora a longo prazo. Segundo a Revista Insper.
Crescimento em alguns setores agrícolas: A guerra comercial entre EUA e China, por exemplo, impulsionou a agricultura brasileira. A participação do Brasil nas importações de alimentos da China aumentou significativamente entre 2016 e 2023, enquanto a dos EUA diminuiu. Segundo a Revista Insper.
Superávit na balança comercial: Apesar dos desafios com os EUA, a balança comercial brasileira tem registrado superávits, indicando um avanço no comércio exterior do país. Por exemplo, em agosto de 2025, o Brasil registrou um superávit comercial total de US$ 6,133 bilhões. Segundo a Revista Insper.
Confira a reportagem no UOL .https://noticias.uol.com.br/
E assim caminha a humanidade
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