No momento em que a variante ômicron do coronavírus avança, o Brasil vive um apagão de dados oficiais.
Quantos casos de Covid o Brasil tem hoje? Em que ritmo avança no país a variante ômicron?
Quem procura na fonte oficial não tem respostas, opendatasus.saude.gov.br, vou compartilhar aqui para você”, diz o pesquisador Diego Xavier, da Fiocruz.
Resposta: “Não é possível acessar esse site.”
“Está vendo? Está assim desde o dia 9 de dezembro. De lá para cá, a gente não sabe o que está acontecendo”, conta
O apagão dos dados oficiais não prejudica só o trabalho desse pesquisador. Assim como Diego Xavier, da Fiocruz, muitos outros cientistas do Brasil estão perdendo informações e dias preciosos no combate à pandemia.
“Se a gente não monitora epidemiologicamente o problema, a gente só vai entender a gravidade quando os hospitais estiverem lotados. E aí já é tarde. A gente não pode pagar para ver o que vai acontecer e, sem dados, a gente está fazendo isso”, destacou.
O apagão de dados também prejudica o trabalho do consórcio de veículos de imprensa, criado para consolidar o número de casos, mortes e vacinados.
O consórcio foi criado para fazer uma totalização independente dos casos e não ficar na dependência do Ministério da Saúde. Isso ocorreu quando o ministério começou a atrasar a divulgação dos dados e consolidá-los com omissões. Os dados brutos passaram a ser apurados pelo consórcio diretamente com cada estado.
Ocorre que muitos estados usam plataformas do Ministério da Saúde para extrair os dados que ali são inseridos pelas equipes de saúde dos municípios, pelos hospitais e até pelas farmácias.
A evolução dos casos, das internações, o número de mortes, a vacinação. Sem esses dados exatos, a comunidade científica não tem um retrato fiel do que está acontecendo na pandemia e, assim, é impossível traçar políticas públicas.
“Se a gente não tem dado para enfrentar a pandemia, é como se fosse um piloto de avião sem plano de voo. Se a gente está voando num avião e a gente não sabe para onde a gente vai, esse avião vai cair”, enfatizou o pesquisador.
A falta de informações oficiais se junta a um outro problema, mais antigo.
Nesses quase dois anos de pandemia, o Brasil ficou marcado por ser um país que faz pouquíssimos testes para Covid em relação ao tamanho da população. Isso torna ainda mais difícil traçar um quadro exato do avanço do vírus. Mesmo assim, nos últimos dias, laboratórios particulares do país registraram não só uma procura maior pelos testes como também um aumento no percentual de resultados positivos.
No mês de dezembro, a rede Dasa tinha pouco mais de 1% de testes positivos de Covid. Antes do Natal, a taxa tinha mais que dobrado, passando dos 3%. No dia 28, um salto: 16%
Junto com o aumento dos casos, a presença maior da nova variante.
“Nosso dado do começo, da primeira quinzena de dezembro, era de 20% dos casos positivos ômicron. Hoje, estima que já esteja em 50%. E essa variante é muito transmissível. Então, tem que tomar o mesmo cuidado que a gente estava tomando antes, que é a máscara, que é o distanciamento, que é evitar aglomeração, principalmente sem máscara”, disse o virologista da rede Dasa José Eduardo Levi.
Dados de outros laboratórios confirmam o aumento de testes positivos. No Grupo Fleury, saltaram de 2% no início do mês para 20% na última semana.
O diretor de outro grupo, o Richet, confirma o aumento e diz que os resultados pegam os pacientes de surpresa.
“A grande maioria dos casos é de pessoas assintomáticas ou com sintomas muito leves. São pessoas assintomáticas que vão fazer o teste por alguma questão burocrática, como, por exemplo, para fazer uma viagem ou para participar de um evento e acaba tendo como surpresa o teste positivo”, afirmou o diretor do laboratório Richet, Hélio Magarinos.
Os números dos laboratórios são importantes, mas só refletem a parcela da população que tem plano de saúde ou pode pagar por exames.
O epidemiologista Pedro Hallal diz que um quadro mais amplo seria fundamental para enfrentar a chegada da nova variante.
“Tem muita gente infectada pela ômicron e que nem sabe. Por quê? Porque não testa, porque o Brasil nunca teve uma política adequada de testagem. Então, as pessoas estão infectadas pela ômicron, algumas delas nem sabem e outras acham que estão gripadas, com uma gripe comum”, enfatizou.
Quem lida com os números gigantescos da pandemia alerta: é cedo para afirmar que casos mais brandos de Covid sejam um alívio para os hospitais e para a saúde pública.
“Os casos e os casos graves são diretamente proporcionais. Então, se a gente tem 100 mil casos de delta e 10% internam, a gente está falando de 10 mil casos. Se a gente tem 1 milhão de casos de ômicron e 1% interna, a gente está falando de 10 mil casos. O problema não diminui. Uma doença mais contagiosa, que tem mais casos, tem uma probabilidade de levar mais pessoas também a ter uma internação e a evoluir para um caso grave”, disse o pesquisador da Fiocruz.
Números apagados, escassez de testes, para os cientistas do Brasil que combatem a pandemia há tanto tempo, a luta fica ainda mais difícil, sem saber onde estão e quantos são os adversários,
“Uma coisa é a cepa mais branda causar infecções mais brandas. Ótimo. Isso é uma ótima notícia. Agora, ter noção do tamanho da realidade é fundamental independentemente de a cepa ser mais branda ou mais agressiva”, destacou Pedro Hallal.
O Jornal Nacional questionou o Ministério da Saúde sobre a falta de informações oficiais e sobre a testagem no país, mas não teve resposta. A informação é do Portal G1 da Rede Globo.
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