quarta-feira, 29 de outubro de 2025

Uma questão

 





A diferença entre a esquerda e a centro-esquerda reside principalmente na sua abordagem em relação ao sistema capitalista e à forma de alcançar a justiça social. A centro-esquerda busca reformá-lo, enquanto a esquerda tradicional (ou radical) busca superá-lo. 

Características da centro-esquerda

A centro-esquerda, também associada à social-democracia, liberalismo social e progressismo, busca um equilíbrio entre a liberdade individual e a igualdade social. Suas principais características incluem: 

Apoio a reformas: Atua pela via eleitoral, buscando reformas que conciliem as políticas de mercado com medidas de proteção social.

Papel ativo do Estado: Defende uma forte intervenção estatal para promover o bem-estar social, reduzir desigualdades e garantir direitos básicos.

Reformismo: Acredita na possibilidade de reformular o sistema de forma gradual, focando em interesses e direitos dos trabalhadores.

Políticas sociais: Busca ampliar direitos sociais, como programas de renda básica, cotas e direitos para minorias, para diminuir a desigualdade social. 

Características da esquerda

A esquerda, que abrange correntes como o socialismo democrático e o marxismo revolucionário, defende transformações mais profundas e estruturais no sistema. Suas características principais são: 

Oposição ao capitalismo: Propõe o fim ou a superação do sistema capitalista, por meio de uma revolução ou de mudanças estruturais, dependendo da vertente.

Socialização dos meios de produção: Defende a propriedade pública de recursos e serviços, com foco na superação da propriedade privada burguesa.

Mudança radical: Busca uma transformação radical na economia, no Estado e na sociedade para redistribuir a riqueza e o poder.

Anticapitalismo e antiglobalização: Vertentes mais radicais da esquerda podem associar-se ao anticapitalismo, à antiglobalização e à rejeição do reformismo. 

Exemplos no Brasil

As nuances entre as posições podem ser complexas e variar com o contexto político. No Brasil, alguns partidos se alinham de formas diferentes a essas correntes: 

Centro-esquerda: O Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido Democrático Trabalhista (PDT), o Partido Socialista Brasileiro (PSB) e a Rede Sustentabilidade (REDE) são frequentemente citados nessa faixa do espectro político.

Esquerda: O Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) são exemplos de partidos no campo da esquerda. Segundo o Sociólogo, Mestre e Doutor Cesar Portantiolo Maia, no Quarto Período da Habilitação em Jornalismo na Comunicação , pelas Faculdades Integradas Alcântara Machado (FIAAM FAAM).

Confira o artigo do autor  Luiz Carlos Bresser-Pereira.

O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL1

 Luiz Carlos Bresser-Pereira

 Luiz Carlos Bresser-Pereira

 RESUMO

 A esquerda costuma vencer as eleições no Brasil, mas não

 governa. Para sustentar o argumento, este artigo repassa os conceitos de direita e esquerda, definindo os grupos polí

ticos de esquerda pela disposição a arriscar a ordem em nome da justiça social. Em segundo lugar, argumenta que, nas

 democracias modernas, não há inconsistência entre uma coalizão de esquerda e o capitalismo. Por fim, mostra como

 na experiência brasileira a esquerda de fato vence as eleições, mas não governa.

 PALAVRAS-CHAVE: partidos políticos; esquerda; democracia moderna;

 sociedade civil.

 SUMMARY

 The left usually wins elections in Brazil but eventually does

 not govern. In order to validate this claim, the paper, first, reviews the concept of left and right, defining the left politi

cal groups by their disposition to risk social order in the name of social justice.Second,the paper argues that in modern

 democracies there is no inconsistency between a left coalition and capitalism.Third,it says that in Brazil the experience

 shows that the left indeed wins elections but does not govern.

 KEYWORDS: political parties; left; modern democracy; civil society.

 [1] Trabalho apresentado na confe

rência “A Esquerda na América Lati

na”,organizada pelo Instituto Uni

versitário de Investigação Ortega y

 Gasset,com a colaboração da Funda

ção Friedrich Ebert e da Fundação Pa

blo Iglesias.Madri,28-29 nov.2005.

 A idéia de esquerda,como todas as demais idéias e ins

tituições na América Latina, é transplantada e em grande parte inau

têntica.Não obstante,é um fenômeno real,na medida em que é sem

pre possível distinguir a esquerda da direita em países capitalistas e

 democráticos.No caso do Brasil,objeto deste trabalho, a esquerda é

 uma realidade tão viva e poderosa que se justifica a questão central que

 quero responder aqui:por que a esquerda no Brasil ganha as eleições

 mas não governa? Este trabalho gira em torno dessa questão — que

 pressupõe um conceito amplo de esquerda — e do problema relacio

nado:existe uma especificidade para a esquerda na América Latina e,

 especificamente,no Brasil? Em que ela se distingue ou deve se distinguir

 da esquerda na Europa,que sempre lhe serviu de parâmetro,para poder

 ser autêntica e ter condições de governar?

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 NOVOS ESTUDOS  74 ❙❙ MARÇO 2006    

Essas questões não têm respostas unívocas.Estamos no campo

 minado das ideologias,no qual é preciso combinar o método histórico

dedutivo da boa ciência social com o método normativo da teoria polí

tica. Espero,entretanto,conseguir dar uma resposta que nos ajude a

 compreender a dinâmica e as crises da esquerda no Brasil.Uma resposta

 que seja aberta o suficiente para poder abrigar uma realidade tão com

plexa e,ao mesmo tempo,precisa a ponto de não se constituir em mero

 rol de lugares-comuns.

 Para responder à primeira questão, terei que definir esquerda e

 direita. E justificar por que não trabalho com o conceito de centro,pres

supondo que uma pessoa ou um partido é de esquerda ou de direita.Isso

 não significa que não admita as situações ambíguas,e sim que não quero

 me perder nelas.Em segundo lugar,terei que mostrar que a esquerda

 quase sempre ganha as eleições no Brasil,desde a transição democrática

 de 1985.Em seguida,terei que explicar por que a esquerda ganha as elei

ções mas o governo que se forma afinal não é de esquerda,não representa

 os interesses dos pobres.Para isso,precisarei de duas coisas:do conceito

 de sociedade civil, que, no Brasil e nos demais países da América Latina,

 diverge, muito mais do que em países desenvolvidos,do conjunto dos

 eleitores votantes,que chamarei de povo;e de um entendimento maior do

 que sejam efetivamente esquerda e direita na região ou no Brasil.

 ESQUERDA E DIREITA

 Há alguns anos venho propondo um conceito geral de esquerda e

 direita que reproduzirei aqui. Esse conceito supõe que o objetivo polí

tico das sociedades modernas é a ordem ou segurança,a liberdade,o

 bem-estar,a justiça e a proteção da natureza ou do meio ambiente.A

 esquerda não se distingue da direita em termos de liberdade ou de pro

moção do bem-estar através do desenvolvimento econômico.Ainda que

 a liberdade política tenha sido originalmente uma conquista da burgue

sia, que fez uso da ideologia do liberalismo,a democracia foi,antes que

 qualquer outra coisa, uma conquista dos pobres e das classes médias,

 que durante o século XIX lutaram com os liberais para obter o sufrágio

 universal. No entanto,embora uma parte da esquerda — a utópica —

 desdenhe o desenvolvimento econômico,que considera assegurado

 pelo capitalismo, quando partidos ou coalizões de esquerda chegaram

 ao poder na Europa revelaram-se tão interessados e capazes de promo

ver o desenvolvimento econômico quanto partidos e coalizões de

 direita.Já em relação a ordem,justiça e proteção do ambiente,as diferen

ças são claras. São tão claras que possibilitam a seguinte definição de

 esquerda e direita.A direita é o conjunto de forças políticas que,em um

 país capitalista e democrático, luta sobretudo por assegurar a ordem,

 dando prioridade a esse objetivo,enquanto a esquerda reúne aqueles

 que estão dispostos,até certo ponto,a arriscar a ordem em nome da jus

tiça — ou em nome da justiça e da proteção ambiental,que só na segunda

 26 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

 26 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

[2] Bresser-Pereira, Luiz Carlos.

 “Por um partido democrático, de

 esquerda e contemporâneo”. Lua

 Nova — Revista de Cultura e Política,no

 39,1997,pp.53-71;e “A nova esquerda:

 uma visão a partir do Sul”. Revista de

 Filosofia Política — Nova Série,vol.6,

 2000. Porto Alegre: Universidade

 Federal do Rio Grande do Sul,Depar

tamento de Filosofia,pp.46-52.No

 segundo trabalho, desenvolvi mais

 extensamente esse conceito,contras

tando-o com o de Bobbio (Bobbio,

 Norberto. Destra e sinistra. Roma:

 Donzelli Editore,1994.Existe tradu

ção para o português.)

 [3] Sader,Emir.O anjo torto: esquerda

 (e direita) no Brasil. São Paulo:Editora

 Brasiliense,1995,p.164.

 metade do século XX assumiu estatuto de objetivo político fundamental

 das sociedades modernas2.

 Adicionalmente,a esquerda se caracteriza por atribuir ao Estado

 papel ativo na redução da injustiça social ou da desigualdade,enquanto

 a direita,percebendo que o Estado,ao se democratizar,foi saindo do con

trole,defende um papel do Estado mínimo,limitado à garantia da ordem

 pública, dando preponderância absoluta para o mercado na coordena

ção da vida social.Porém,em relação ao Estado,há divergências dentro

 da própria direita, porque a experiência histórica mostra que apenas

 quando há forte aliança dos empresários com a burocracia do Estado se

 consubstancia uma estratégia nacional de desenvolvimento.Por sua

 vez,por muito tempo a esquerda rejeitou o Estado,que para Marx seria

 “o comitê executivo da burguesia”,e para os anarquistas,o mal maior.No

 entanto,a experiência histórica demonstrou que nas democracias o

 Estado foi deixando de representar apenas os interesses da classe domi

nante para transformar-se em principal instrumento de ação coletiva à

 disposição da sociedade.Enquanto no processo histórico o capitalismo

 se revelava,a um só tempo,um regime injusto e corrupto — mas o único

 sistema econômico viável porque relativamente eficiente —,a democra

cia se revelava o instrumento por excelência através do qual as socieda

des modernas domavam esse capitalismo:tornavam-no menos injusto

 e menos corrupto.Por isso,a esquerda reconciliou-se com o Estado,tor

nando-se prioritário para ela,nos termos de Sader,“a deslocação da

 polarização neoliberal entre estatal/privado para a construção do caráter

 público do Estado brasileiro”3. Quanto mais democrático se torna o

 governo do Estado,mais público ele se torna,ou seja,atende mais às

 demandas dos cidadãos e menos às das minorias poderosas.

 Embora a defesa da intervenção do Estado regulando e corrigindo o

 capitalismo seja importante na distinção entre direita e esquerda,o ele

mento central dessa definição está na oposição entre ordem e justiça

 social. A proteção do meio ambiente é também cada vez mais impor

tante, na medida em que os grupos políticos que adotam essa posição

 sejam em geral também mais de esquerda que de direita.Já os outros

 dois objetivos políticos centrais das sociedades modernas (a liberdade e

 o bem-estar) não distinguem historicamente a esquerda da direita,já

 que,no passado,tivemos a defesa ardorosa da liberdade e a competência

 em promover o bem-estar dos cidadãos partindo de governos de

 esquerda e de direita,como tivemos a violência contra a democracia e a

 incompetência em promover o desenvolvimento econômico origi

nando-se em partidos políticos com as duas orientações. Quando,

 porém,se trata da ordem,o verdadeiro conservador não hesita,e lhe dá

 sempre prioridade sobre a igualdade,que,para ele muitas vezes nem

 sequer é um valor significativo. Já o verdadeiro progressista também

 preza a ordem,a segurança,contudo sabe que o progresso social envolve

 liberdade de protesto por parte dos mais pobres,dos que de alguma

 forma se sentem oprimidos — o que implica certo risco para a ordem.O

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conservador afirma em qualquer hipótese o primado da lei;o progres

sista reconhece a necessidade do estado de direito, mas sabe também

 que a lei é com freqüência feita para defender os pobres contra os ricos e

 que aqueles muitas vezes não têm alternativa para se fazer ouvir senão

 enfrentar a lei. A democracia é o regime da ordem,da lei e do compro

misso,porém é também o regime do conflito social e da argumentação.

 A esquerda sabe que entre justiça e ordem existe uma contradição que os

 regimes democráticos devem,em princípio,ajudar a resolver.Enquanto

 a direita busca sempre que possível negar essa contradição na medida

 em que o estado de direito ou o império da lei tem absoluta precedência

 sobre a justiça,para a esquerda a lei muitas vezes representa o status quo,

 portanto os interesses dos ricos,e por isso precisa ser mudada a partir da

 pressão dos movimentos sociais,os quais,por falta de alternativa,nem

 sempre usam de meios puramente legais para exercer essa pressão.Já

 para a direita essa forma de arriscar a ordem ou a lei é inaceitável.

 Em toda parte,inclusive no Brasil,a esquerda enfrenta uma contra

dição básica:enquanto a direita representa claramente os interesses dos

 ricos, principais defensores da ordem,a esquerda em princípio deveria

 representar os interesses dos pobres ou dos trabalhadores,mas na prá

tica muitas vezes representa também os interesses das classes médias

 profissionais ligadas ao Estado. Existe aí um problema sério,porque,

 por mais que procure identificar-se com os pobres que pretende infor

malmente representar,essa classe média acaba representando também

 seus próprios interesses.O fato de esquerda e direita representarem

 interesses de classe é inevitável e até desejável,desde que essa represen

tação não seja meramente corporativa — ou seja,desde que o político

 não suponha que seu papel é o de apenas representar os interesses dos

 que o apóiam ou o elegem.Nos países mais avançados politicamente,

 esse corporativismo é contrabalançado pelo espírito republicano dos

 cidadãos e dos políticos,que logram,até certo ponto,agir em função de

 suas convicções sobre o que seja o interesse público,mesmo quando isso

 colide com seus interesses pessoais.

 A definição que acabei de apresentar para direita e esquerda é uma

 definição histórica; parte da observação empírica do comportamento

 efetivo dos grupos políticos identificados como esquerda ou direita.

 Em uma definição desse tipo,não seria necessário acrescentar que a

 esquerda defende na teoria o socialismo e na prática o estatismo,

 enquanto a direita defende o capitalismo? Sim,mas com restrições.O

 socialismo foi por muito tempo uma utopia da esquerda, porém

 quando esta se viu no poder,como aconteceu depois da Revolução

 Comunista de 1917,o sistema econômico afinal estabelecido foi o esta

tismo,não o socialismo.Por quê? Porque a sociedade russa estava

 longe de ter a igualdade de conhecimentos necessária para poder

 implantar com êxito um regime socialista.Essa é a contradição central

 da revolução socialista:busca a igualdade,mas para alcançá-la precisa

 que a igualdade,pelo menos de conhecimentos ou capacidades,já

 28 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

 28 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

[4] Whitaker, Chico. O desafio do

 Fórum Mundial. São Paulo: Editora

 Perseu Abramo,2005,pp.15 e 19.Ver

 também Aguiton,Christophe et al.

 Où va le mouvement altermondialisa

tion? Paris: La Découverte, 2003 e

 Fougier, Eddy. Altermondialisme, le

 nouveau mouvement d’emancipation?

 Paris:Liges de Repères,2004.

 esteja razoavelmente implantada. Mesmo os países hoje mais desen

volvidos e com trabalhadores mais educados,teriam dificuldade em

 estabelecer um regime socialista, porque as diferenças de educação e

 competência técnica e organizacional entre os cidadãos continuam

 muito grandes.O que dizer de uma sociedade atrasada como era a

 russa e todas as demais que realizaram revoluções que se pretendiam

 socialistas? Estabeleceu-se ali,portanto,não o socialismo,mas o esta

tismo.Este teve êxito em promover a industrialização pesada a partir

 de forte acumulação forçada de poupanças,porém afinal revelou sua

 incapacidade econômica de competir com o capitalismo.Dessa forma,

 o ideal socialista continua a ser um ideal das esquerdas,mas a centro

esquerda em especial, ou esquerda moderada,limita-se a pensar nele

 como utopia e trata de promover de forma reformista a justiça e a defesa

 do meio ambiente no capitalismo.

 Há muitos tipos de esquerda,mais que de direita,provavelmente

 porque esta,além dos valores e idéias,tem o capital a uni-la,enquanto a

 esquerda só tem valores e idéias.Podemos distinguir pelo menos quatro

 tipos de esquerda:a extrema esquerda,a esquerda utópica,a esquerda

 burocrático-sindical,e a centro-esquerda.

 A extrema esquerda é revolucionária,não vê na democracia existente

 senão uma forma de dominação:pretende assumir o poder revoluciona

riamente para,em seguida,implementar o que denomina socialismo —

 o que seria mais correto chamar de estatismo.

 A esquerda utópica prefere não disputar o poder para manter seus

 ideais socialistas e para poder ser uma força crítica dentro da sociedade.

 Nos dias atuais,esse é o caso,em especial,do extraordinário movimento

 “outromundialista”,que se formou a partir dos encontros do Fórum

 Social Mundial.Seus participantes mais representativos afirmam que

 não aspiram ao poder,mas querem ser a consciência crítica das socieda

des capitalistas contemporâneas,e querem “contribuir para que a socie

dade faça prevalecer, em toda parte, a justiça social, a solidariedade e a

 paz”,ou,em outras palavras,“um outro mundo possível”4.Esse objetivo

 é sem dúvida legítimo,e o movimento já tem dado contribuições positi

vas na direção pretendida,na medida em que a enorme repercussão de

 suas ações tem obrigado os governantes conservadores ou progressistas

 a mudar algo de suas políticas.

 A esquerda burocrático-sindical joga o jogo democrático,tem bases

 fortes na burocracia do Estado e nos sindicatos, se autodenomina

 esquerda simplesmente e,enquanto fora do poder,mantém um discurso

 formalmente socialista.

 A centro-esquerda reconhece a impossibilidade de transição para o

 socialismo dentro de um prazo previsível e,usando uma frase de Michel

 Rocard,trata de “governar o capitalismo mais competentemente que os

 capitalistas”.Ou seja,é uma esquerda reformista,que durante o século XX

 foi social-democrata,mas está se transformando em centro-esquerda

 social-liberal,na medida em que os partidos de esquerda na Europa vêm

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reformando suas economias e seu Estado no sentido de manter a garan

tia aos direitos sociais e aprofundar a igualdade, ao mesmo tempo que

 aceitam um papel mais ativo de mercados regulados na coordenação do

 sistema.O social-liberalismo representa uma superação positiva da

 social-democracia;entretanto,da mesma forma que a social-democracia

 foi por muito tempo acusada de trair os ideais do socialismo revolucioná

rio,agora se acusa o social-liberalismo de trair os ideais da social-demo

cracia.Hoje,os países que apresentam governos de esquerda mais bem

sucedidos — caso dos escandinavos,da Holanda e da Grã-Bretanha —

 estão deixando de ser social-democratas para ser social-liberais.A princi

pal mudança é a reforma da gestão pública,auxiliada por organizações de

 serviço públicas não estatais na realização,de forma competitiva,de ser

viços sociais e científicos.Com isso,o Estado diminui o número de servi

dores,mantendo dentro de seu aparelho apenas servidores de alto nível e

 prestígio.A despesa pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB)

 se mantém elevada,mas,paralelamente,aumenta de modo substancial a

 eficiência dos serviços prestados pelo Estado,e os direitos sociais passam

 a ser mais respeitados, devido à melhoria da quantidade e da qualidade

 dos serviços5. Embora prestigie os altos servidores públicos,essa pers

pectiva de reforma da gestão pública não tem espaço para servidores de

 nível médio e baixo,ou para quem não realiza atividades específicas de

 Estado.Não é surpreendente,por isso mesmo,que encontre forte oposi

ção da esquerda burocrático-sindical.

 Entre a extrema esquerda e a centro-esquerda há,naturalmente,uma

 gradação de posições saindo do discurso da revolução para o da reforma

 social. Poderíamos chamar apenas de esquerda a posição intermediária,

 cara aos intelectuais:uma esquerda que não faz compromissos nem com

 a burguesia nem com a burocracia.Essa esquerda,porém,não existe no

 plano político:só idealmente.No Brasil,um de seus principais intérpre

tes é Emir Sader,que,em vez de opor justiça social a ordem,define a

 esquerda pela oposição entre justiça e neoliberalismo. “No Brasil”, diz

 ele,“ser de esquerda significa a contraposição ao neoliberalismo.” Essa é

 uma definição correta,porque é por meio do neoliberalismo que a ordem

 se manifesta hoje, embora haja um número razoável de conservadores

 que também se opõem a ele.No entanto,o problema da revolução socia

lista é evitado com a idéia de que “ser de esquerda no mundo de hoje sig

nifica participar de forma concreta de uma nova sociedade”6.Quando,

 entretanto,se procura saber o conteúdo dessa nova sociedade,verifica

mos que esse projeto não existe,porque seus propugnadores sabem não

 poder ser socialistas mas não querem admitir o capitalismo reformado.

 Como fica claro em uma obra posterior de Sader,o mais importante

 seriam mudanças na política econômica.Segundo o autor,essa nova

 sociedade teria como pilares a renegociação da dívida externa,a renego

ciação da dívida pública e políticas econômicas que privilegiam a distri

buição de renda7.Em que pesem minhas ressalvas pessoais em relação a

 essas políticas8, é importante assinalar aqui que elas não levam a uma

 [5] Expus mais amplamente o con

ceito de social-liberalismo, aplicado

 sobretudo à reforma do Estado,em

 Democracy and public management

 reform: building the Republican state.

 Oxford: Oxford University Press,

 2004.A França e a Alemanha conti

nuam resistindo à reforma da gestão

 pública, presos que estão ao modelo

 burocrático clássico. Essa é uma ex

plicação importante para o mal de

sempenho econômico desses países

 nos últimos dez anos.

 [6] Sader,Emir.O anjo torto,p.194.

 [7] Sader,Emir.A vingança da histó

ria. São Paulo: Boitempo Editorial,

 2003,pp.175-76.

 [8] Embora profundas modifica

ções sejam necessárias na política

 econômica do governo,não se justi

fica o calote, tanto da dívida externa

 como da interna.Mais importante é

 reduzir drasticamente a escandalosa

 taxa de juros Selic (o que importaria

 em redução do valor presente da

 30 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

 30 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

dívida), e adotar uma nova política

 de proteção ao capital e ao trabalho

 nacionais,interrompendo a absurda

 abertura financeira do Brasil ao capi

tal externo.

 “nova sociedade”: apenas buscam reformar de maneira muito modesta

 o capitalismo.Não há,portanto,razão prática para no plano ideológico

 — aquele em que nossa discussão está inserida — distinguir esquerda

 de centro-esquerda,a não ser que quiséssemos incluir entre os critérios

 de distinção competência ou propriedade das políticas econômicas

 sugeridas — o que não é o caso.

 INEXISTENTE, MAS FUNDAMENTAL

 Na discussão do conceito de esquerda,é essencial debater o problema

 do centro — ou,mais especificamente,do centro que se move.No meu

 entender,no quadro das sociedades modernas,não existem agrupamen

tos políticos de centro. Aqueles que assim se autodenominam são sem

pre de direita.Na verdade,alguém ou algum grupo ou é de esquerda ou de

 direita. Podemos e devemos transformar essa dicotomia em uma escala

 ideológica que vai da extrema direita para a estrema-esquerda,passando

 por direita, centro-direita, centro-esquerda e esquerda.Ficamos,assim,

 com uma escala de seis formações políticas,porém sem um centro.Nessa

 escala,o centro é inexistente:alguém ou algum grupo ou é de esquerda ou

 de direita.É inexistente,mas,como ponto virtual,é fundamental.Porque

 esse centro se move de modo cíclico ora para um lado ora para outro,e por

que toda a luta ideológica entre esquerda e direita nas democracias

 modernas se trava em torno da questão de empurrar esse centro mais para

 a esquerda ou mais para a direita.

 O que vimos no mundo,desde meados dos anos 1970,foi o êxito da

 direita em mover o centro para a direita,com a ofensiva ideológica neo

liberal. Nos anos 1990,diante do fracasso parcial das reformas e pro

messas da direita,iniciou-se um movimento do centro para a esquerda,

 mas a eleição infausta e controvertida de um presidente conservador no

 país dominante,os Estados Unidos,interrompeu esse processo.Na

 América Latina,porém,na qual o fracasso das reformas neoliberais foi

 radical,continua o movimento do centro para a esquerda.Isso aconteceu

 porque algumas dessas reformas,em especial a abertura financeira,além

 de serem concentradoras de renda,revelaram-se contrárias aos interes

ses nacionais do desenvolvimento econômico.O enorme desenvolvi

mento dos países asiáticos — que, embora comprometidos com o

 desenvolvimento capitalista,rejeitaram as reformas propostas ou pres

sionadas a partir do Norte — vem aprofundando esse movimento dos

 países latino-americanos para a esquerda,não obstante a hegemonia

 dos Estados Unidos sobre a região.

 O centro inexistente — ou,para ser mais preciso,apenas existente

 como realidade virtual,como ponto de referência a dividir a esquerda da

 direita — é,assim,paradoxalmente todo-poderoso,porque a luta polí

tico-ideológica nas democracias modernas diz respeito a ele.Os movi

mentos do centro são pendulares:ora o centro caminha para a esquerda,

 como aconteceu no mundo a partir da Grande Depressão dos anos 1930,

 NOVOS ESTUDOS  74 ❙❙ MARÇO 2006    

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ora caminha para a direita, como ocorreu a partir de meados dos anos

 1970.Esses movimentos ocorrem na medida em que se esgotam as pro

postas de governo de um ou outro grupo e os eleitores situados mais ao

 centro deslocam-se na direção oposta à dominante.

 Contudo é preciso considerar que o centro varia geograficamente.

 Nos Estados Unidos,onde nunca houve um movimento socialista forte,

 o centro está muito mais à direita que na Grã-Bretanha, a qual por sua

 vez está mais à direita que a França,a Alemanha,ou a Espanha.Essa dife

rença geográfica de posição do centro se deve a razões de ordem histó

rica, que não importa discutir aqui.O importante é deixar claro que,se

 aceitarmos essa variação no centro,o conceito de esquerda e direita

 torna-se relativo. Políticas consideradas de esquerda nos Estados Uni

dos poderão ser consideradas de direita na França.Os políticos progres

sistas ou de esquerda americanos são em geral associados ao Partido

 Democrata,e denominados liberais,numa referência ao século XVIII e

 começo do XIX,quando os liberais eram progressistas lutando em nome

 da burguesia,contra conservadores ainda aliados à aristocracia.

 Ainda convém assinalar que,ao afirmar que o centro se move no

 tempo e que varia de país para país,reconheço uma limitação na defi

nição teórica que ofereci no início.Se for estrito em definir esquerda

 e direita em relação a ordem e justiça,não faria sentido essa variação.

 Seria sempre de esquerda arriscar a ordem, admitir a ação de movi

mentos sociais (como greves),restringir sem violência ações ilegais

 de outros movimentos sociais (como as invasões que, no Brasil, os

 sem-terra e os sem-teto com freqüência promovem) e apoiar suas rei

vindicações. Em contrapartida,defender a lei a qualquer preço, usar

 da autoridade tradicional e religiosa para justificar posições políticas

 e morais seria sempre de direita. Isso, porém, é verdadeiro até certo

 ponto.Nas questões sociais,o princípio da razoabilidade deve preva

lecer sempre,e esse princípio rejeita distinções claras e precisas entre

 branco e preto.A realidade social é ambígua.A direita tende a pressu

por que o ser humano é,por natureza,egoísta ou auto-interessado;a

 esquerda,a pensá-lo como generoso ou capaz de generosidade. Na

 verdade, o ser humano é intrinsecamente contraditório e, portanto,

 ambíguo.Ele nasce com duas necessidades fundamentais e contradi

tórias: de um lado,o instinto da sobrevivência o faz individualista e

 egoísta;de outro,o instinto da convivência o torna solidário e coope

rativo. Toda a sociedade humana está baseada nessa ambigüidade,

 por isso os cientistas sociais enfrentam tanta dificuldade em prever

 seu comportamento.

 ESQUERDA E NAÇÃO

 O interesse e a capacidade de promover o desenvolvimento econô

mico,assim como a liberdade,não distinguem a esquerda da direita.É

 natural que cada um dos agrupamentos políticos afirme ser mais capaz

 32 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

 32 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

de uma coisa ou de outra,mas vimos historicamente governos de direita

 e de esquerda sendo bem-sucedidos e desastrosos em relação a esses

 dois objetivos políticos. Entretanto,nesta seção argumentarei que,

 quando se pensa na definição de esquerda em países em desenvolvi

mento,seria preciso incluir a idéia de desenvolvimento como objetivo

 básico e a idéia de nação como objetivo para o desenvolvimento.Histo

ricamente,na Europa do século XIX e de Marx,a burguesia era naciona

lista e a esquerda,internacionalista.O internacionalismo da Internacio

nal Socialista, porém, nunca convenceu os trabalhadores, que não

 hesitaram em de alguma forma associar-se à burguesia e aos técnicos do

 governo quando se tratava de competir internacionalmente.Foi isso que

 permitiu que todos os países capitalistas bem-sucedidos no plano eco

nômico consolidassem ao mesmo tempo o projeto de construção de

 seus Estados-Nações.Uma Nação só ganha coesão e força,e o Estado só

 se torna instrumento de ação coletiva dessa Nação,se as classes sociais,

 não obstante os conflitos,são capazes de tornar-se solidárias quando se

 trata de competir com outras nações.No momento,porém,em que a

 construção nacional e o desenvolvimento se consolidaram naqueles paí

ses do Norte,o nacionalismo deixou de ser uma ideologia expressa para

 tornar-se subentendida.O nacionalismo é a ideologia da construção do

 Estado-Nação,é o princípio básico que alimenta as relações internacio

nais tanto na fase da Diplomacia do Equilíbrio de Poderes como na fase

 da Política do Sistema Global,e é a afirmação da prioridade dos interes

ses nacionais em relação aos demais países vistos como competidores.

 Na prática,implica atribuir aos governos a responsabilidade de defender

 o trabalho, o conhecimento e o capital nacionais.Hoje,nesses países,

 como nos países dinâmicos da Ásia — muito diferentemente do que

 acontece nos países dependentes da América Latina — quase ninguém

 tem dúvida de que esse é o dever de seus governos,de forma que se tor

nou desnecessário reafirmar o próprio nacionalismo,transformado em

 valor consensual.Tornou-se,então,possível ocultar essa perspectiva,

 sempre incômoda nas relações internacionais,e reservar o adjetivo

 nacionalista para as perversões do nacionalismo, para suas expressões

 extremadas e violentas como o nazismo,ou para formas de populismo

 de direita e de esquerda em países em desenvolvimento.Para os países

 ricos, esse ocultamento tem a vantagem não prevista de neutralizar o

 eventual nacionalismo dos países em desenvolvimento,tornando suas

 elites mais dóceis às diretrizes vindas do Norte,sobretudo às políticas de

 seu interesse econômico.

 Diante desse quadro,a esquerda nos países em desenvolvimento

 não pode reproduzir dos países ricos nem o discurso sobre naciona

lismo,nem o discurso da esquerda.O motivo não é apenas o nível de

 desenvolvimento econômico e político,menor que o da França,Alema

nha ou Grã-Bretanha.É preciso não esquecer que o Brasil,embora apre

sente uma sociedade dual e,portanto,uma economia subdesenvolvida,

 já é uma sociedade capitalista moderna.Porém,é preciso também consi

33

 33

 NOVOS ESTUDOS  74 ❙❙ MARÇO 2006    

derar que os países de desenvolvimento médio não lograrão evitar a

 dominação vinda do Norte,se não adotarem as políticas e instituições

 necessárias para seu desenvolvimento.Nos últimos vinte anos,en

quanto os países asiáticos dinâmicos continuavam a usar do naciona

lismo para construir seus Estados nacionais e para promover com êxito

 seu desenvolvimento,os países latino-americanos — que entre os anos

 1930 e 1980 estavam realizando suas revoluções nacionais — viram essa

 construção ser interrompida9.Nos últimos vinte anos,a nação brasi

leira, a partir da crise da dívida externa transformada em crise fiscal do

 Estado e em inflação alta, perdeu autonomia real e voltou à condição

 semicolonial,enquanto era submetida à onda ideológica neoliberal e

 globalista vinda do Norte.Isso ocorreu porque o antigo modelo nacio

nal-desenvolvimentista,bem-sucedido em promover a industrialização

 do país entre 1930 e 1980,entrou em crise.Ocorreu também porque a

 pressão ideológica globalista vinda do Norte — a qual afirmava que na

 era da globalização o Estado-Nação perdera relevância e anunciava a

 governança global em um mundo sem fronteiras — tornou-se fortís

sima a partir daquela mesma data.E ocorreu,finalmente,porque as eli

tes brasileiras conservadoras e dependentes,sobretudo aquelas ligadas

 ao setor financeiro,aderiram rápido às novas idéias.

 Nesses termos,seria razoável esperar que,nos países latino-ameri

canos,a esquerda fosse nacionalista e tivesse como prioridade o desen

volvimento econômico.No Brasil,isso aconteceu quando os grupos de

 esquerda mais representativos afinal se associaram aos empresários

 industriais no pacto nacional-desenvolvimentista de Vargas e Kubits

chek (1930-60).Na América Latina,porém,a esquerda deixou de ser

 nacionalista desde que os empresários apoiaram os golpes militares no

 Cone Sul.A adoção da “teoria da dependência”,seja na versão marxista,

 seja na versão da “dependência associada”,não foi motivo para que a

 esquerda se tornasse mais nacionalista,como se poderia imaginar;pelo

 contrário,fez com que copiasse a clássica perspectiva internacionalista

 da esquerda européia do século XIX.Partindo do pressuposto de que não

 seria possível haver um empresariado nacional na América Latina,a pri

meira versão da teoria da dependência concluiu pela revolução socia

lista,e a segunda pela associação com os países ricos10.Contudo,a prio

ridade dada ao desenvolvimento econômico foi abandonada pela

 esquerda;na medida em que ela assumiu que no capitalismo o desenvol

vimento ocorreria de qualquer maneira,de forma a caber-lhe a preocupa

ção com a democracia e a justiça social.Entretanto,embora seja verdade

 que,para os países que completaram sua revolução industrial,o desen

volvimento capitalista tenda a ser auto-sustentado11,isso não é verdade

 para os demais,submetidos a processos de imperialismo.Nesse caso,

 suas elites se tornaram ambíguas em relação aos interesses nacionais,

 porque ao mesmo tempo que se identificavam com esses interesses,

 eram ideologicamente dependentes do centro desenvolvido12.Esse tipo

 de consciência, porém,não ocorreu nas esquerdas latino-americanas e

 [9] Furtado,Celso.Brasil: a constru

ção interrompida. São Paulo:Editora

 Paz e Terra,1992.

 [10] Bresser-Pereira, Luiz Carlos.

 “Do Iseb e da Cepal à teoria da depen

dência”.In Toledo,Caio Navarro de

 (org.), 50 anos do ISEB. São Paulo:

 Editora da Unesp,2005.

 [11] Furtado, Celso.“O processo his

tórico do desenvolvimento”.Indesen

volvimento e subdesenvolvimento. Rio de

 Janeiro: Editora Fundo de Cultura,

 1961. Republicado em Bresser-Pe

reira, Luiz Carlos e Rego, José Márcio

 (orgs.). A grande esperança em Celso

 Furtado. São Paulo:Editora 34,2002.

 [12] Em “Do Iseb e da Cepal à teoria da

 dependência” chamei essa dependên

cia não de “associada”,nem de contra

partida da “superexploração imperia

lista”, mas de “nacional-dependente”–oximoro que salienta o caráter con

traditório das elites empresariais e

 intelectuais em países dependentes

 como o Brasil.

 34 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

 34 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

brasileiras, cujos intelectuais são também dependentes.Fizeram,por

tanto,o que é inerente à situação de dependência não criticada:copiaram

 o internacionalismo das esquerdas européias,não se dando conta de que

 elas só adotaram o internacionalismo em teoria,enquanto se associa

vam aos empresários na construção da nação e na participação em estra

tégias nacionais de desenvolvimento.

 O PARADOXO DA ESQUERDA

 [13] Lozano,Wilfredo.“La izquierda

 latinoamericana en el poder”. Nueva

 Sociedad,no 197,2005,p.145.

 [14] Dimoser,Ditmar.“Democracia

 sin democratas:sobre la crisis de la

 democracia en América Latina”.

 Nueva Sociedad,no197,2005,p.40.

 Se o centro varia geograficamente,seria interessante perguntar o que

 acontece com o centro no Brasil ou na América Latina. Está mais à

 esquerda ou mais à direita do que nos países desenvolvidos da Europa

 continental? Não sei responder com clareza, porque a divisão entre

 esquerda e direita enfrenta uma dificuldade fundamental na região.Não

 quero falar por toda a América Latina,onde a esquerda hoje está presente

 no governo da Argentina,do Uruguai,do Chile,da Venezuela e do Brasil.

 Conforme observou Wilfredo Lozano,“a esquerda hoje no poder resulta

 ser um complexo produto de sua reacomodação reformadora,o que a

 obrigou a girar para o centro”13.Quanto,entretanto,girar para o centro? E

 o giro é apenas para o centro ou para a direita? Ditmar Dimoser,em texto

 sobre a democracia na América Latina,pergunta “estará o futuro latino

americano caracterizado por democracias sem democratas?”14.Tal per

gunta envolve um paradoxo absoluto.No caso do Brasil,não em relação à

 democracia mas sim à esquerda,a questão está dominada por outro para

doxo,que talvez não esteja ausente do restante da América Latina:a

 esquerda ganha as eleições,na medida em que partidos de esquerda ou de

 centro-esquerda alcançam a maioria no Parlamento,porém não governa.

 Proponho denominar esse fenômeno de “paradoxo da esquerda”.Será ele

 verdadeiro? Se for,há uma explicação ou é um paradoxo puro?

 Tabela 1

 Deputados federais eleitos – (1986-2002) 

Fonte:www.iuperj.br/deb/port/Indice.htm.Autor:Jairo Nicolau (Iuperj)

 Nota:Partidos considerados de esquerda:PT,PSDB,PMDB,PDT,PSB,PCB/PPS,PCdoB e PV;os demais

 foram considerados de direita.

 Para responder a essas perguntas,parto do pressuposto de que a

 ideologia determina o voto no Brasil.Esse pressuposto teórico foi posto

 em dúvida por uma série de analistas internacionais,a maioria de filia

NOVOS ESTUDOS  74 ❙❙ MARÇO 2006    

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ção conservadora,que também tendem a negar a relevância da diferença

 entre esquerda edireita. Mas afinal as pesquisas deixaram claro que os

 eleitores — apesar da falta de estrutura ideológica definida,para a qual

 seriam necessários conhecimentos que eles não têm — possuem identi

ficação ideológica suficiente que lhes permite distinguir as posições de

 esquerda ou de direita, progressistas ou conservadoras.Singer testou

 essa hipótese em relação ao Brasil,e a viu confirmada15.O Brasil transi

tou para a democracia em 1985.Desde então,conforme os dados da

 Tabela 1, os partidos que dominam o Parlamento brasileiro (por ordem

 histórica,PMDB,PSDB e PT) sempre se autodefiniram como partidos

 de esquerda — os dois primeiros de centro-esquerda, o último de

 esquerda — e,junto com os pequenos partidos de esquerda,lograram a

 maioria na Câmara dos Deputados16.Entre os três presidentes eleitos

 diretamente pelo povo desde 1985, dois se autodenominaram de

 esquerda,Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva,e ape

nas um aceitava ser de direita,Fernando Collor.É verdade que nem todos

 os parlamentares desses partidos podem ser considerados de centro

esquerda:depois que o PT se tornou governo,alguns petistas são antes

 de centro-direita, apesar dos programas e das mensagens políticas de

 centro-esquerda.

 No Brasil,é evidente por que os partidos e os candidatos presiden

ciais de esquerda tendem a ser eleitos com mais freqüência do que os de

 direita.Está diretamente relacionado com a brutal desigualdade social

 existente no país.Essa desigualdade,somada aos baixos níveis de edu

cação e de formação cívica do povo brasileiro, fazem-no esperar dos

 políticos um discurso voltado para melhor distribuição de renda. Os

 políticos de esquerda podem fazer isso de forma natural,sem necessa

riamente serem populistas;já os candidatos de direita só são capazes de

 formular um discurso dessa natureza sendo populistas.Os candidatos

 de direita que ganham eleições executivas no Brasil são quase sempre

 políticos populistas e demagógicos,com um discurso que não corres

ponde a suas convicções.Já os candidatos de esquerda podem ser mais

 autênticos,embora não estejam livres do populismo.

 Entretanto,uma vez eleitos,nem o presidente nem os parlamentares

 de esquerda fazem um governo de esquerda,ou seja,que de fato contri

bua para reduzir a injustiça social no país.Podem incluir em suas admi

nistrações algumas políticas sociais redistributivas,atendendo assim à

 pressão dos pobres,mas afinal seus governos promoverão sobretudo os

 interesses dos ricos,e a renda e a riqueza se manterão concentradas.Isso

 foi possível observar no governo Sarney (1985-89),imediatamente

 após a transição democrática.O próprio presidente não era um político

 da esquerda,e sim um nacionalista populista que militou no partido do

 governo durante o regime militar;porém o Parlamento eleito em 1986

 era dominado por políticos de centro-esquerda,que haviam se oposto

 ao regime militar.Não obstante,não há nada no governo Sarney que se

 possa identificar como de esquerda.Pelo contrário,nos últimos dois

 [15] Singer,André.Esquerda e direita

 no eleitorado brasileiro. São Paulo:

 Edusp,1999.

 [16] Não lograram,todavia,maioria

 no Senado.

 36 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

 36 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

[17] Esses funcionários haviam rece

bido o nome de marajás,e o candidato

 comprometeu-se habilmente a aca

bar com o privilégio.

 anos o governo caminhou para a direita:o presidente firmou acordo com

 um grande grupo conservador que se formou então no Congresso com o

 nome de Centrão.

 O primeiro presidente eleito pelo voto popular foi Fernando Collor

 de Mello,em 1989.Era um político conservador.Mas é importante

 salientar que,mais que de direita,ele era um político populista.Isso por

que logrou estabelecer contato direto com a população em nome da

 moralização da burocracia,especificamente dos salários abusivos de um

 certo número de altos funcionários,aproveitando-se da alta inflação em

 vigor desde 1980 e de falhas legais no sistema de correção monetária dos

 salários17. Sua mensagem moralista,entretanto,não impediu que ele

 próprio se envolvesse em corrupção,a ponto de,dois anos depois,ser

 afastado do governo mediante um processo de impedimento.

 O próximo presidente eleito,Fernando Henrique Cardoso,tinha

 uma trajetória conhecida:inicialmente,como intelectual de esquerda;

 depois,como político de centro-esquerda.Provinha do PSDB,partido

 que se pretende socialdemocrata inclusive no nome:Partido da Social

 Democracia Brasileira.Foi eleito porque,como ministro da Fazenda no

 governo intermediário de Itamar Franco,logrou controlar a alta inflação

 brasileira com um plano de estabilização que neutralizava com compe

tência a inércia inflacionária.Entretanto,seu governo foi antes e centro

direita que de esquerda.Foi de centro-esquerda na área social,na medida

 em que aumentou a carga tributária e gastou mais e com mais competên

cia em educação,saúde,reforma agrária e assistência social.Mas seu

 governo acabou concentrando renda.Adotou uma política cambial que

 aprofundou a desnacionalização da economia brasileira e levou a duas

 crises de balanço de pagamentos. Adotou igualmente uma política

 monetária de elevadas taxas de juros do Banco Central (BC),a qual bene

ficiou os rentistas,ou seja,os que vivem de juros,e o sistema financeiro

 que recebe comissão dos rentistas.

 Mais surpreendente é o governo de direita que vem fazendo o presi

dente Luiz Inácio Lula da Silva.Como o PT se declarava um partido cla

ramente mais à esquerda do que o PSDB,os mercados financeiros nacio

nais e internacionais pressupunham que sua eleição representasse uma

 clara guinada do Brasil para a esquerda. A segunda crise de balanço de

 pagamentos do governo Cardoso,em 2002,deveu-se em parte a essa

 desconfiança.Entretanto,o que se viu foi um governo que,embora con

servasse suas alianças com o sindicalismo e movimentos sociais como o

 Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST),revelou-se

 logo claramente de direita.Isso ficou bastante claro em relação à política

 monetária:o nível da taxa de juros básica do BC,que já era a mais alta do

 mundo,aumentou ainda mais para satisfazer os rentistas.A taxa de

 juros real em 2005 foi em média de 12%,quando o risco Brasil não jus

tificava mais que 3%.De um gasto com juros pelo setor público estimado

 em 160 bilhões de reais em 2005,correspondendo a 8% do PIB,apenas

 40 bilhões de reais são justificáveis:o restante é mera transferência aos

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credores do Estado brasileiro, que se tornou refém com a desculpa de

 que essa taxa é necessária para combater a inflação.Temos,assim,chan

celada por um governo de esquerda,uma brutal transferência de renda

 dos pobres e da classe média,que pagam impostos (principalmente

 indiretos,no Brasil) para os ricos,que recebem juros e,no mercado

 financeiro,comissões.Além disso,a política social do governo não reve

lou inovações.O único gasto social que aumentou foi o assistencialista,

 com a substituição do Bolsa Escola,que exigia dos pais pobres que os

 filhos estivessem na escola,para o Bolsa Família.Ou seja,em vez de

 ênfase em políticas universalistas, que são de esquerda,adotou uma

 política conservadora de focalização. E afinal, no terceiro anodo man

dato,tornou-se público que esse governo e o próprio PT,que durante

 anos insistira em seus padrões éticos,se envolvera em um processo sem

 precedentes de corrupção política,conhecido com o nome de “escândalo

 do mensalão”.O PT pagava com dinheiro o apoio que recebia de deputa

dos de outros partidos,financiando-se com recursos oriundos eviden

temente de empresas beneficiadas pelo governo18.Em síntese,conforme

 observou Fernando Cardim de Carvalho em trabalho recente sobre a

 esquerda e a política econômica no Brasil,“o primeiro governo FHC foi

 quase a antítese do que seria esperado da passagem pelo poder de um

 partido autodenominado socialdemocrata” 19.Porém “poucos discorda

riam da afirmação que o governo Lula não perseguiu nenhuma das prio

ridades que caracterizam qualquer governo de esquerda no século XX”.

 Em outras palavras,foram governos eleitos pela esquerda,mas não

 foram governos de esquerda.

 GOVERNAR O CAPITALISMO

 Não tivemos,portanto,governos de esquerda no Brasil desde a tran

sição democrática de 1985,não obstante a maioria do eleitorado votasse

 em candidatos de esquerda.Antes de tentar explicar esse fato,porém,

 uma pergunta preliminar é essencial:pode a esquerda governar o capita

lismo? É possível pensar em governos de esquerda governando um sis

tema econômico que em essência continua capitalista,ou seja,coorde

nado pelo mercado,e voltado para o lucro privado?

 A resposta é positiva, se examinarmos a experiência de um sem

número de governos de partidos ou coalizões de centro-esquerda na

 Europa desde a Segunda Guerra Mundial.Partidos que agem nos ter

mos da definição de esquerda apresentada nas primeiras seções deste

 trabalho têm se revelado muitas vezes capazes de governar o capitalismo

 de forma mais competente que os capitalistas.São de esquerda porque

 buscam reformar esse capitalismo,porque procuram distribuir melhor

 a renda e caminhar na direção de maior igualdade de oportunidades,

 porque defendem maior liberdade individual nos quadros de uma socie

dade mais solidária. São sempre partidos de centro-esquerda. Não

 existe a hipótese de um partido de extrema esquerda governar um país

 [18] A imprensa tem feito ampla co

bertura desse escândalo.Talvez a me

lhor reportagem até agora tenha sido

 feita por Norman Gall (“Lula e Mefis

tófoles”. Braudel Papers,no 38,2005,

 pp.1-14).O governo Lula e o PT reco

nheceram as irregularidades,mas ten

taram identificá-las com caixa dois em

 campanhas eleitorais, ou seja, com

 doações de dinheiro não declaradas ao

 fisco e aos tribunais eleitorais. Dessa

 forma,o PT estaria fazendo algo usual

 no processo de financiamento de cam

panhas eleitorais. Ao longo desse

 escândalo,porém,foi ficando claro que

 o processo envolvia corrupção stricto

 sensu, seja pela compra de votos de

 deputados de outros partidos, seja

 pelo fato de os recursos provirem de

 empresas estatais cujos contratos de

 publicidade eram sobrefaturados ou

 de fornecedores do Estado,que com

pensavam as doações com sobrefatu

ramento dos serviços.Além disso,não

 se tratava de simples financiamento de

 campanhas eleitorais,já que o sistema

 passou a fazer parte do governo fede

ral, como antes fizera parte dos gover

nos municipais em que o PT elegera o

 prefeito.

 [19] Carvalho,Fernando J.Cardim.

 “FHC, Lula e a desconstrução da

 esquerda”.Rio de Janeiro:Instituto

 de Economia da UFRJ,2005,cópia,

 pp.10 e 15.

 38 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

 38 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

[20] Przeworski, Adam. Capitalism

 and social democracy. Cambridge:

 Cambridge University Press,1985.

 [21] As pesquisas de Lijphart (Lij

phart, Arend.Patterns of democracy.

 New Haven: Yale University Press,

 1999) e de Esping-Andersen (Esping

Andersen,Gosta.The three worlds of

 welfare capitalism.Princeton,NJ:Prin

ceton University Press,1990) sobre

 modelos de democracia e de capita

lismo são significativas nesse ponto.

 capitalista.Não conheço sequer uma experiência de tentativa desse tipo.

 O governo Allende,por exemplo,assim como muitos outros governos

 de esquerda derrubados por forças de direita nacionais e externas, não

 era um governo de extrema esquerda. Foi apenas um governo de

 esquerda que,não sabendo governar o capitalismo melhor que os capi

talistas, cometeu erros que facilitaram a reação da direita e do imperia

lismo,e por fim o golpe sangrento.

 Para governar o capitalismo melhor e com mais justiça que uma

 coalizão de direita,uma coalizão de esquerda precisa reconhecer a lei

 básica do capitalismo:a taxa de lucro dos empresários e dos capitalis

tas ativos deve ser mantida em nível satisfatório para que eles conti

nuem a investir.Conforme observou Przeworski,os empresários têm

 o “poder de veto” sobre o sistema.20 Se deixam de investir, o cresci

mento econômico estanca e o país entra em crise.Por isso,é essencial

 algum tipo de associação com os empresários produtivos.Já os capita

listas rentistas,que no passado viviam de aluguéis e hoje vivem prin

cipalmente de juros pagos pelo governo,não podem ser aliados de um

 governo de esquerda.Também não pode ser aliada de uma coalizão de

 esquerda uma parte dos empresários produtivos que se recusam a

 fazer compromissos com os trabalhadores e as classes médias profis

sionais.Da mesma forma,não pode fazer parte do sistema de apoio a

 uma coalizão de esquerda o grupo de profissionais que,sabendo ser o

 capitalismo hoje o capitalismo do conhecimento ou dos técnicos,

 aproveita-se desse fato para obter ganhos extraordinários apoiados

 em seu conhecimento técnico.Não pode porque um governo só será

 de esquerda se,além de ser formado por políticos que se definem como

 de esquerda,lograr,ainda que marginalmente,desconcentrar a renda

 e a riqueza; transformar em realidade mais concreta a igualdade de

 direitos entre pobres e ricos,entre mulheres e homens,entre as diver

sas raças;avançar na implantação de maior igualdade de oportunida

des de renda, poder e prestígio social; dar à democracia um caráter

 mais representativo e mais participativo.Não será possível ou realista

 esperar grandes ganhos nessa matéria,mas a experiência mostra que

 países governados mais longamente por coalizões de esquerda,assim

 como países nos quais o centro esteja mais à esquerda, alcançam

 níveis mais elevados de democracia e de justiça social.Não é por outra

 razão que o modelo capitalista existente nos países escandinavos é

 superior em termos de justiça e democracia,comparado aos países do

 modelo renano,o qual,por sua vez,é superior ao nível de justiça social

 e de democracia existente nos Estados Unidos.Não é fácil comprovar

 uma afirmação geral como essa,porém não é difícil chegar a essa con

clusão quando se comparam,entre outros indicadores,os índices de

 violência e distribuição de renda, assim como as formas de financia

mento de campanhas políticas21.

 Sob essa perspectiva,merece citação especial a experiência recente

 de oito anos de governo trabalhista na Grã-Bretanha.Esse governo teve

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início com uma proposta de “terceira via”22 — nome inadequado para

 um conjunto de idéias concretas sobre como um governo de esquerda

 moderna pode governar o capitalismo de forma mais competente que

 os capitalistas.Embora essas idéias estivessem apoiadas em um soció

logo de esquerda de alto prestígio como Anthony Giddens, foram

 amplamente criticadas pelas esquerdas de outros países e mesmo da

 Grã-Bretanha23.Na Europa continental,sobretudo,duvidou-se de que

 fossem de fato idéias de esquerda, ignorando que na Grã-Bretanha o

 centro está mais à direita que no modelo renano da França e da Alema

nha.Entretanto,a prova de qualquer coisa só pode ser empírica.Cabe,

 portanto,perguntar o que aconteceu naquele país depois de oito anos

 de governo trabalhista.Nesse período,que terminou com nova reelei

ção, os trabalhistas, apesar do apoio inconsiderado à trágica invasão

 americana do Iraque,foram bem-sucedidos em realizar um governo de

 esquerda.Em tempo de globalismo,no qual seus ideólogos não se can

sam em afirmar que todos os países estão submetidos a uma “camisa de

 forças”,não tendo alternativa senão seguir o modelo neoliberal ameri

cano24,os trabalhistas britânicos fizeram o caminho inverso:estabele

ceram o salário mínimo,tornaram os impostos mais progressivos e

 aumentaram em cinco pontos percentuais o gasto em educação e

 saúde,enquanto apresentavam excelente desempenho econômico25´.

 Com isso,melhorou a distribuição de renda.E o capitalismo britânico,

 desde Thatcher identificado com o sistema americano,se aproximou

 do modelo renano ao invés de afastar-se dele, como prediz a tese do

 caminho único26.

 POVO E SOCIEDADE CIVIL

 O governo de esquerda em países capitalistas é,portanto,viável.As

 experiências européias não deixam dúvida a esse respeito.Por quê,

 então,no Brasil não tem sido viável,ainda que os eleitores elejam candi

datos de esquerda ou,pelo menos,com discurso de esquerda? A resposta

 mais geral a essa questão está no fato de que como nos demais países em

 desenvolvimento,há aqui grande descompasso entre o “povo” e a “socie

dade civil”,e é nesta última que sempre está o verdadeiro poder político

 nas democracias.Coloquei as duas expressões entre aspas,porque estou

 usando-as em sentido muito preciso:povo,aqui,é o conjunto de cida

dãos iguais perante a lei,dotados do direito de voto;sociedade civil é esse

 povo no qual, porém, o poder de cada cidadão é ponderado pelo

 dinheiro,pelo conhecimento e pela capacidade de organização.Não

 estou,portanto,confundindo sociedade civil,conceito clássico,com

 “organizações da sociedade civil”, principalmente organizações públi

cas não estatais de advocacia políticas — as chamadas organizações não

 governamentais stricto senso—,base da lenta transição das atuais demo

cracias de opinião pública para as democracias participativas.Enquanto

 o conceito de organizações da sociedade civil permite o desenvolvi

[22] Terceira via foi uma expressão

 utilizada durante muito tempo,em

 especial por autores católicos, para

 sugerir que haveria uma terceira pos

sibilidade em relação ao conflito

 entre capitalismo e socialismo.A ter

ceira via britânica não tinha essa pre

tensão, pretendia ser apenas uma

 forma de manifestação da socialde

mocracia ou,mais precisamente,do

 social-liberalismo: a socialdemocra

cia, que,embora garantindo os direi

tos sociais, usa mais os mecanismos

 de mercado,inclusive no oferecimen

to de serviços sociais e científicos,

 tornando assim mais eficiente o apa

relho do Estado.

 [23] Giddens, Anthony. Beyond left

 and right. Cambridge: Polity Press,

 1994;The third way and its critics. Cam

bridge:Polity Press,2000;e Giddens,

 Anthony (org). The global third way

 debate. Cambridge:Polity Press,2001.

 [24] Thomas Friedman (The lexus and

 the olive tree.2 ed.Nova York:Random

 House, 2000) não tem dúvida em

 usar a expressão straight-jacket para

 argumentar que só existe uma forma

 possível de capitalismo eficiente: a

 americana.

 [25] França, Alemanha e Itália apre

sentaram desempenho pior por moti

vos diversos.A meu ver,não foi por

 terem deixado de reduzir a proteção

 ao trabalho, como insiste a direita,

 mas por não terem feito a reforma da

 gestão pública ou reforma gerencial

 do Estado,no qual a Grã-Bretanha foi

 pioneira.

 [26] Pearce, Nick e Dickson, Mike.

 “New model welfare”.Prospect,no10,

 maio 2005,pp.20-21.

 40 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

 40 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

[27] Esse conceito de sociedade civil,

 porém,foi muito útil para a análise

 que fiz, na segunda metade dos anos

 1970,da transição democrática que

 então começava.

 [28] Ver excelente resenha do debate

 sobre as organizações da sociedade

 civil que surgiram como alternativa

 emancipadora nos anos 1990:Lava

lle,Adrián Gurza.“Sem pena nem gló

ria: o debate sobre a sociedade civil

 nos anos 1990”.Novos Estudos,n-o66,

 pp.91-109,julho 2003.

 mento de uma teoria de emancipação social por meio da emergência da

 democracia participativa ou da democracia deliberativa,o conceito de

 sociedade civil não tem caráter normativo27.Sugere apenas que a socie

dade politicamente organizada — ou seja,a sociedade civil — tende a ser

 mais conservadora.E talvez menos democrática que o povo,porque

 aqueles indivíduos que possuem mais capital,mais conhecimento téc

nico, organizacional e comunicativo — e estão inseridos em organiza

ções, sejam elas corporativas ou públicas não-estatais — terão indivi

dualmente mais poder que os cidadãos comuns.

 Quanto mais avançada uma democracia,mais democratizada sua

 sociedade civil; por isso mesmo, menor será a diferença entre ela e o

 povo28.Enquanto,em uma sociedade civil autoritária,ela própria não

 se distingue com clareza do conceito de elites, a distinção é clara no

 caso de sociedades civis democráticas.Entende-se aqui por sociedade

 civil mais democrática exatamente aquela na qual é menor a diferença

 de poder de seus participantes em relação ao poder de cada cidadão no

 povo.Ora,isso acontecerá na medida em que,em cada sociedade,

 aumentar o grau de igualdade de renda,conhecimento,capacidade de

 organização e, portanto, de poder político real. Ou seja, quando

 aumentar o grau de justiça social existente nessa sociedade. Dessa

 forma,embora liberdade,garantida pela democracia,e justiça,trazida

 pelo crescente respeito aos direitos sociais, sejam objetivos políticos

 independentes,a teoria política indica que afinal eles são também

 interdependentes quando pensamos em termos de graus de liberdade

 e em graus de justiça. Em sociedades como a sueca,ou a suíça,nas

 quais as desigualdades são relativamente pequenas,a sociedade civil é

 fortemente democrática,diferenciando-se pouco do povo.Assim,

 nessas sociedades,uma vez eleito pelo povo,um governo de esquerda

 — que afinal reflete o poder da sociedade civil — fará uma administra

ção de esquerda.

 Enquanto isso,em sociedades menos democráticas e menos justas,

 como as latino-americanas,o descompasso entre povo e sociedade civil

 é enorme.O povo não tende necessariamente a ser mais democrático

 que a sociedade civil,como bem mostram as pesquisas sobre o tema rea

lizadas por entidades como o Latinobarómetro,mas tende a ser mais de

 esquerda,na medida em que demanda do Estado políticas ativas mais

 distributivas. Dado esse descompasso,uma vez eleito um governo de

 esquerda, a tendência dos novos governantes para alcançar ‘le

gitimidade’ política na sociedade civil será identificar-se rapidamente

 com as percepções e os valores centrais dessa sociedade,que é a fonte real

 de legitimidade.A fonte da legalidade política,nas democracias,é sem

pre o povo,porém a da legitimidade é dada antes pelo apoio da sociedade

 civil.Observe-se que essa afirmação,como quase todas as demais que fiz

 neste texto, obedece a um critério antes histórico que normativo.Do

 ponto de vista normativo,seria melhor que legitimidade e legalidade se

 confundissem,mas nesse caso bastaria apenas um conceito.Por isso,e a

 NOVOS ESTUDOS  74 ❙❙ MARÇO 2006    

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partir de Weber,uso o conceito de legitimidade para indicar o fato de que

 um governo conta com o apoio da sociedade civil,enquanto emprego o

 conceito de legalidadepara dizer que foi eleito regularmente pelo povo.O

 primeiro é um conceito real — sociológico e histórico –,o segundo é um

 conceito formal — jurídico,no sentido estrito dessa palavra.No governo

 recém-eleito,há tendência de a legalidade e a legitimidade política coin

cidirem,mesmo que o governo eleito seja de esquerda e não tenha con

tado com o apoio da sociedade civil na eleição.Isso porque,eleito o novo

 governo,a sociedade civil tenderá a dar um voto de confiança aos novos

 governantes.Entretanto,a sociedade civil,e sobretudo seus componen

tes mais à direita,esperam que o novo governo,ainda que conservando

 uma retórica de esquerda,revele rapidamente seu respeito pela proprie

dade e pelos contratos — pela ordem estabelecida,portanto –,e que não

 adote políticas redistributivas fortes.Caso contrário,o governo correrá

 o risco de perder seu apoio.

 Foi o que aconteceu no Brasil,logo após a eleição de Luiz Inácio Lula

 da Silva no final de 2002.O governo contou com essa boa vontade ini

cial das elites,e para conservá-la tratou de conformar-se quase integral

mente a essa vontade.No plano da política econômica,em especial,no

 qual os interesses da direita rentista e financeira eram muito grandes,a

 conformidade foi total e permanente.Com isso,o governo deixou de

 ser de esquerda. Atendeu a interesses da classe média profissional —

 maioria dos integrantes do PT — realizando uma ocupação de cargos

 públicos antes reservados à burocracia profissional do Estado. Esse

 “aparelhamento” do Estado,porém,não é uma política de esquerda,e

 sim apenas uma forma de corporativismo ou clientelismo.Contudo,

 com a estratégia de conformidade,nos primeiros dois anos o governo

 logrou não apenas acalmar os mercados financeiros,que estavam em

 crise no momento da eleição,mas manter durante esse período o apoio

 da sociedade civil. Perdeu-o apenas no terceiro ano,em função das

 denúncias de corrupção então surgirdas.Foi só a partir desse momento

 que o governo Lula perdeu legitimidade,embora conservasse a legali

dade,e por isso paralisou-se.

 O descompasso entre uma sociedade civil mais conservadora e um

 povo que — não obstante o autoritarismo de que é vítima — vota em

 candidatos de esquerda,explica,portanto,por que no Brasil a es

querda tende a ganhar as eleições mas afinal não governa. O sistema

 de incentivos existente em uma sociedade como essa leva à infideli

dade dos políticos a seus comprometimentos.Há outras razões que

 explicam por que a esquerda tem dificuldade de governar em um país

 como o Brasil.Já me referi ao caso da extrema esquerda,cuja incapaci

dade de governar o capitalismo é auto-explicativa.Em todos os países

 temos também uma esquerda utópica,cuja opção por não ser governo

 é explícita, prefere, ao contrário, conservar o papel de crítica do

 governo.Em um caso como esse,porém,a pergunta central deste tra

balho não se aplica.

 42 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

 42 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

REPUBLICANISMO E CORPORATIVISMO

 Ficando,porém,apenas com os partidos políticos de esquerda que

 querem governar na democracia,a pergunta seguinte ao que foi exposto

 até aqui é saber se,dado o descompasso existente no Brasil entre povo e

 sociedade civil, é inevitável que os partidos ou coalizões de esquerda,

 uma vez eleitos,não façam governos de esquerda.Não creio.Certamente

 os partidos de esquerda vitoriosos terão que fazer compromissos — afi

nal,a política é a arte do compromisso.Certamente não realizarão tudo

 o que seu programa prevê,ou mesmo o que foi prometido nas eleições —

 isso sempre acontece nas democracias,com partidos de qualquer orien

tação.Mas eu acredito que,em um país capitalista de desenvolvimento

 médio como Brasil,é possível haver governos de esquerda.

 O que é preciso para isso? A meu ver,duas coisas:espírito republi

cano e habilidade política.É essencial ou espírito ou a virtude republi

cana.Não vou discutir aqui se é viável ou não.No contexto desse tra

balho,suponho que sim,com base na referida existência de dois (e não

 um só) instintos humanos básicos:o da sobrevivência e o da convi

vência.Considerando essa possibilidade como pressuposta,entendo

 por republicano o político ou o partido político que, em alguns

 momentos,arrisca perder o apoio de seus eleitores para agir de acordo

 com suas convicções do que seja o interesse público.Seus apoiadores

 políticos querem algo contrário ao que o político julga ser o interesse

 nacional.Não importam as razões de uns ou do outro.O importante é

 haver divergência.Se o político tem a coragem necessária para arriscar

 sua reeleição, agindo de acordo com suas convicções,será republi

cano,e seu republicanismo poderá ser uma saída para o paradoxo da

 esquerda no Brasil.

 Não basta,porém,espírito republicano.É preciso também compe

tência política.A política é uma arte na qual não valem apenas princípios

 éticos e boas intenções.Vale também a habilidade de fazer compromis

sos e argumentar para alcançar maioria.Porque,afinal,a política não é

 outra coisa senão a arte do compromisso e da argumentação.É o exercí

cio da prudência,na perspectiva de Aristóteles;é a busca do bem comum,

 na perspectiva tomista e lockiana; é a virtù do governante na busca dos

 objetivos republicanos,na visão de Maquiavel;é o exercício da ética da

 responsabilidade,na forma de ver a política de Max Weber.Não é,por

tanto,tarefa fácil. No entanto,essas qualidades e responsabilidades da

 política,que a fazem a mais nobre das profissões,não estão limitadas aos

 políticos de esquerda.Com freqüência também são observadas em polí

ticos conservadores,os quais,porém,não enfrentam as contradições

 enfrentadas por políticos de esquerda.Por isso,para estes a tarefa é mais

 difícil,por isso seu espírito republicano tem que ser mais forte,por isso

 sua habilidade política é mais necessária.

 Quando vemos a esquerda no Brasil curvar-se a uma sociedade civil

 que é principalmente de direita e que se apóia em um sistema internacio

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 NOVOS ESTUDOS  74 ❙❙ MARÇO 2006    

nal cujos interesses são contrários aos do país, só podemos explicar o

 fato pela força dessas elites conservadoras. É preciso, entretanto, não

 limitar a análise e reconhecer que há também falta gritante de espírito

 republicano e de competência política.Ambos faltaram ao PSDB,e falta

ram em maior grau ao PT.Segundo palavras de Tales Ab’Sáber,em um

 debate público, no caso do PT houve “descolamento da política do

 espaço social ainda mais radical do que já é;a política se autonomiza,se

 transforma em um grande balcão de negócios”29.Esse descolamento ou

 descompasso,nesse caso,se aprofundou porque o PT,embora tivesse

 expectativa de ocupação a longo prazo do poder político (como o PSDB

 tivera antes),não foi capaz de fazer a crítica do corporativismo que está

 em suas origens sindicais.Um líder sindical é legitimamente corporati

vista:seu papel é defender os interesses dos associados,do grupo econô

mico que representa.Um político,porém,não pode ser corporativista.

 De acordo com a ética da política que hoje prevalece nas sociedades

 democráticas,ele deve,em princípio,ser republicano,distinguindo os

 interesses próprios,e também os interesses daqueles que representa

 diretamente,dos interesses nacionais.O PT,como partido de origem

 sindical, nunca foi capaz de fazer essa distinção,e também por esse

 motivo não foi capaz de enfrentar o poder das elites no seio da sociedade

 civil brasileira. Nas palavras de Marcos Nobre, presente no mesmo

 debate citado acima,o PT geriu o governo como se fosse um partido,e

 geriu um partido como se fosse um sindicato.Além disso,salientou

 Nobre,faltou ao governo do PT capacidade para oferecer ao país uma

 alternativa de política não apenas econômica,mas também social:a crise

 acontece “porque não se consegue de fato mobilizar um discurso polí

tico e estabelecer um modelo político para o Brasil”30.Ao fazer essas afir

mações,ele volta ao problema do descompasso entre o povo e a socie

dade civil brasileira.

 Apesar da gravidade da crise por que vem passando o PT e o governo

 Lula, que por certo desgastou-o profundamente, tem razão Sader

 quando critica a tentativa de “desqualificar o arcabouço histórico da

 esquerda,responsável pelos melhores momentos da história da huma

nidade,em nome de comportamentos que significaram o abandono

 desses valores e a adoção de métodos e políticas de direita”31. Fabiano

 Santos,no mesmo debate,defendeu a tese de que,apesar da crise,o PT

 continua a ser “o representante da socialdemocracia no Brasil”32.Tenho

 feito muitas vezes afirmação semelhante.Embora não seja impossível,a

 hipótese de o PSDB preencher esse papel continua remota,dados os

 apoios com que o partido conta.Como continua incerta a possibilidade

 de o PSDB dar um passo adiante e tornar-se um partido social-liberal.A

 possibilidade de surgir um novo partido de esquerda mais capaz de

 governar tampouco parece provável.O efeito maior da crise política foi

 enfraquecer o PT,mas não o levou ao esfacelamento.Os resultados das

 eleições presidenciais de 2006 são agora incertos,porém é provável que

 o Parlamento tenha novamente uma maioria de esquerda.Em qualquer

 [29] Ab’Sáber,Tales. Declarações em

 debate sobre o PT promovido pela

 Folha de S.Paulo em 13/10/05.Resumo

 publicado na edição de 18/10/05.

 [30] Nobre,Marcos.Declarações em

 debate sobre o PT promovido pela

 Folha de S.Paulo em 23/10/05.Resumo

 publicado na edição de 18/10/05.

 [31] Sader, Emir. “PT, direita e es

querda”.Folha de S.Paulo, 13/10/05,

 p.3.

 [32] Santos, Fabiano. Declarações

 em debate sobre o PT promovido pela

 Folha de S.Paulo. Resumo publicado

 na edição de 18/10/05.

 44 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

 44 O PARADOXO DA ESQUERDA NO BRASIL ❙❙ Luiz Carlos Bresser-Pereira

Recebido para publicação 

em 15 de janeiro de 2006.

 NOVOS ESTUDOS

 CEBRAP

 74,março 2006

 pp. 25-45

 74,março 2006

 pp. 25-45

 hipótese,nada sugere que a curto prazo o paradoxo da esquerda no Bra

sil encontre solução: o povo continuará votando na esquerda,mas ela

 não governará.  Luiz Carlos Bresser-Pereiraé professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo. O artigo do autor   Luiz Carlos Bresser-Pereiraé professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo. .

O progressismo é uma ideologia política e social que se baseia na crença de que a sociedade deve progredir continuamente para se tornar melhor. Os progressistas defendem transformações políticas e reformas sociais, opondo-se ao conservadorismo, que prioriza a manutenção da tradição. 

Princípios e ideias

Visão de progresso: A noção de "progresso" no progressismo não é estática e evoluiu ao longo do tempo. Historicamente, ligava-se à ciência e ao Iluminismo, mas hoje abrange uma gama mais ampla de pautas sociais.

Abordagens de mudança: O progressismo pode defender tanto abordagens revolucionárias quanto reformas abrangentes para resolver problemas sociais.

Reconhecimento de identidades: Uma característica moderna do progressismo é a defesa de pautas ligadas a movimentos sociais e de identidade, como feminista, LGBTQIA+, negro e ambientalista.

Papel do Estado: A intervenção do Estado é vista como importante para promover melhorias sociais, como garantir direitos humanos e sociais. Essa crença distingue os progressistas de certos liberais que defendem menor intervenção estatal.

Cidadania inclusiva: Defende um projeto democrático mais plural e inclusivo, buscando ampliar a cidadania para grupos marginalizados ou minoritários. 

Relação com espectro político

Embora frequentemente associado à esquerda, o progressismo não se limita a essa vertente do espectro político. A crença no progresso pode ser adotada por diferentes ideologias, e existem variações como o "conservadorismo progressista", que combina elementos de ambas. 

Progressismo e conservadorismo

A principal diferença entre as duas ideologias é a abordagem em relação ao futuro e à sociedade:

Progressismo: Acredita que o mundo está em constante mudança e que a transformação política é necessária para alcançar o progresso.

Conservadorismo: Defende a estabilidade política e a manutenção da tradição, questionando a ideia de que a mudança social é sempre benéfica. 

Manifestações do progressismo

O progressismo pode se manifestar em diferentes áreas, com suas próprias características: Segundo o Sociólogo, Mestre e Doutor Cesar Paortantiolo Maia, no Quarto Periodo da Habilitação em Jornalismo na Comunicação Social, pelas Faculdades Integradas Alcântara Machado ( FIAAM FAAM)

Progressismo cultural: Foca nas mudanças sociais e culturais. Pode ser sinônimo de liberalismo cultural

Centro esquerda e esquerda seguem seus desafios no Brasil. 

Confira a noticia  na Folha de São Paulo                .https://www1.folha.uol.com.br/poder/2025/10/boulos-em-ministerio-de-lula-abre-disputa-na-esquerda-por-seu-milhao-de-votos-em-sp.shtml

E assim caminha a humanidade.

Imagem ; Folha de São Paulo. 


 


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