Erra quem pensa que a decisão de Edson Fachin que tornou o ex-presidente Lula elegível agradou ao Palácio do Planalto.
Bolsonaro e assessores foram pegos totalmente de surpresa pela manobra do ministro do Supremo Tribunal Federal, que chegou ao Palácio pela imprensa. Entre ministros militares próximos ao presidente, a reação foi de espanto e preocupação. Desta vez, nem as habituais galhofas que costumam acompanhar os comentários sobre adversários do ex-capitão foram ouvidas nos gabinetes do terceiro andar. A notícia de que a "jararaca" poderia estar de volta ao páreo trouxe um clima soturno ao Palácio.
Lá, a avaliação até ontem era que o PT iria de Fernando Haddad —e que Haddad não iria muito longe. Os olhos dos assessores presidenciais estavam voltados para o nome que poderia unir o centro, captando forças da direita e da esquerda para fazer frente a Bolsonaro.
Mas com Lula no radar tudo muda de figura.
Entre os aspectos benignos considerados pelo Planalto na nova configuração está o de que a provável candidatura do ex-presidente petista, dono de rejeição maior que a de Haddad, pode trazer de volta ao colo de Bolsonaro parte dos seguidores de classe média que ficaram pelo caminho. Como lembra um assessor, "os moristas, por exemplo, não engolirão Lula".
A desvantagem é o aumento do risco de derrota.
Haddad, ex-prefeito de São Paulo, é um candidato bem mais fácil de vencer do que Lula (foi fartamente lembrada ontem a pesquisa do Ipec, Inteligência em Pesquisa e Consultoria, publicada no último fim de semana dando conta de que, entre dez nomes de presidenciáveis lembrados por eleitores, o do ex-presidente é o único que supera o de Bolsonaro em aceitação).E, se na classe média e média alta, a ideia da volta da "jararaca" pode fortalecer Bolsonaro, o mesmo não necessariamente ocorre nas classes D e E.
É lá que, desde a primeira rodada do auxílio emergencial, encontra-se boa parte dos eleitores de Bolsonaro. E é esse segmento que o ex-capitão será forçado a dividir com Lula caso a candidatura do petista se confirme.
Nessa disputa, Bolsonaro encontra-se em franca desvantagem. Hoje, o que o presidente tem a oferecer aos eleitores mais pobres é um país em que o preço do feijão aumenta a cada dia e o valor do auxílio emergencial encolhe para menos da metade.
Já a imagem de Lula continua associada aos tempos de bonança. Antes do Bolsa Família, o Nordeste chegou a ter 66% de sua população vivendo abaixo da linha de pobreza. Entre 2003 e 2013, a região teve um índice de crescimento de 4,1% ao ano, quase um ponto percentual acima do crescimento do país. Em 2012, a economia local cresceu o triplo da brasileira. Difícil esquecer o quanto esses números significam quando eles se traduzem em comida na mesa.
Na fotografia de hoje, portanto, Bolsonaro oferece um país mergulhado numa crise sanitária e econômica e Lula acena com a promessa da volta dos bons tempos.
Como a nostalgia quase sempre é superior à realidade, o risco é o de que o ex-capitão passe a competir com o petista em "bondade", ou seja, gastança — caso em que só restará aos brasileiros apertar os cintos para suportar as turbulências populistas que devem vir por aí. O relato é da Jornalista THAÍS OYAMA, no Portal UOL, na manhã desta quarta feira (10).
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